sábado, 23 de junho de 2018

MUITO SANGUE NAS PALAVRAS DE JACK HORN, UM VELHO SOLDADO INGLÊS DA BATALHA DO BUSSACO CONTRA OS FRANCESES


...Lá me desloquei ao alpendre, onde o tal inglês me aguardava, levando o meu pai atrás de mim, a estalar de curiosidade.
         O inglês era um homem alto, bastante louro, de olhos profundamente azuis, entroncado, envergando umas calças muito coçadas e ainda o casaco vermelho, já cheio de remendos, que um dia fora a farda do exército de Sua Majestade Britânica. O homem usava um barrete bem português. Logo se descobriu assim que me viu. A noite já descia, pelo que o meu pai trazia uma candeia com algumas velas acesas.
- Muito boas noites – disse eu.
- Boas noites. É o sêor doctor jôquim? – perguntou o homem num português muito imperfeito.
- Eu próprio. Qual é a sua graça?
- My name é Jack Horn.
- Senhor Jack, aflige-o alguma maleita?
- Não sêor, não tenho maleitas, graças ao bom Dios.
- Se não é a saúde que o apoquenta, qual é então o assunto que o faz vir falar comigo?
- Coisa séria, multo séria doctor. Mas aqui podem ouvir…
         Eu reconsiderei um momento. O homem pedia alguma privacidade. Levei-o então para uma pequena cozinha existente nas traseiras da casa. O meu pai, entusiasmado com o mistério que se adivinhava, foi buscar uma picheira de vinho e três copos, para alegrar um pouco a conversa. Instalados naquele pequeno espaço, onde a velha Celeste fazia a lavagem para os porcos, sentámo-nos em três desconfortáveis mochos, em redor de uma tosca mesa de pinho.
- Diga-me então, senhor Jack, o que tem para me contar?
         O homem, antes de começar, bebeu de um trago o copo que o meu pai lhe enchera de vinho.
- Good – disse o inglês, dando um estalido com a língua, começando então – num sei se  doctor já oiviu falar about me. Sou um velho soldier inglês, e combati aqui perto, no Bossaco, em Mil Oitocentos Dez. Fiquei multo ferido, a morte quase me levou, mas axudado por pessoas ganhei à maldita; é good ter amigós por aí. Um desses amigós, um friend do myo peito, era um bom rapaz, o Lúcio. Os paes dele morreram, por isso vivia muito alone. Yo sou mais velho que ele, tenho mais saber da vida que ele. Por isso o Lúcio me contava a sua vida toda. Era um boy a quem trabalho não mete medo. Um dia ficou a gostar de uma rapariga, a filha do Xicao Aduelas…
- Espere aí – interrompi-o eu – vossemecê está-me a falar dos mortos que apareceram nas terras do senhor Conde de Cértima, não está?
- Exacly. Desses mesmos. O Lúcio andava multo contente por namorar aquela rapariga, e até era do agrado do sêor Xicao. Mas há algum time ago começou a ver nela diferenças. A night, em que se zangarom, ele ficou a modos que amuado e deixou-se ficar perto da casa dela. Entom, de repente, viu ela sair de casa, às escondidas do pai. O Lúcio achou aquilo very strange; e seguiu ela. E para syo espanto viu ela ir para lados das terras do Caunde, onde há a little church, ao pé das pedras. Parou de repente de a seguir porque oiviu cascos de cavalos. Mas viu que ali havia qualquer mentira. Dias depois viu ela com uma saia nova e preguntou a ela de onde vinha o dinheiro para aquilo. Ela disse que ele no tinha nada com isso. O Lúcio ficou zangado. E foi than que ao contar estas cousas todas, me pediu para yo ir com ele quando a voltasse a seguir, porque ele tinha a certeza que ela, at night, fugia. E foi assim que ontem à noite yo fui com o Lúcio a seguir a Adélia. Nós vimos ela entrar na little church, que tinha uma pequena luz lá dentro. O Lúcio ficou maluco da cabeça. Queria avançar. Eu agarrei ele e disse que no, para esperar e ver o que ia passar a seguir. Mas o Lúcio mandou-me uma porrada na minha perna que tem bocados de bala de canhom, e com a dor eu deixei ele ir. Ele runed away como um doido e chegou à entrada da little church. Eu oivi ele gritar: « à minha puta » e logo a seguir aparecyo a man. O Lúcio atirou-se a ele e o homem dar-lhe um coice na cara. O Lúcio recuou mas foi outra vez contra o home. Entom vi o home com uma espada na hand e mesmo com a luz fraca vi a ponta da espada a aparecer nas costas do Lúcio, que ficou quieto. Depois o homem puxou a espada, e yo vi, com lágrimas nos myos olhos, a ponta da espada a sair. O Lúcio caiu ali mesmo. Eu atirei-me para o chão e meti-me no meio dos fetos da forest, não fosse o homem to see me. Então oivi a rapariga gritar e vi ela sair da little church a correr. Ela vinha quase sem roupa. O homem correu atrás dela e com uma faca cortou-lhe a garganta. Than, o home ficou furioso e dizia: « mas para que havia o cabron de vir aqui cheirar ». E nesse momento eu conheci o matador – era o filho do sêor caunde...(ex. XXVIII)

in Alma de Liberal
Junho/2009


quarta-feira, 13 de junho de 2018

NUM TABULEIRO DE FRUTA PORTUGUÊS




Ontem comprei um saco de maçãs starking, e ao colocá-las no tabuleiro da fruta reparei que tinham vindo do Brasil. Hoje comprei um saco de maçãs fuji, e ao fazer a mesma acção vi que, estas, vinham de França. Bom, foi um regalo observar no tabuleiro as maçãs a abraçarem-se umas às outras, cordialmente, trocando experiências culturais num tabuleiro português.
E então coloquei-me a questão: onde está a lógica de um produtor de fruta, nesta caso maçãs, como o é Portugal, importar o mesmo produto?
Pelo menos valeu a pena ver a festa que ia para ali no tabuleiro!