domingo, 26 de agosto de 2018

1973- O REGRESSO A CASA


-... E foi assim senhor Victor que o seu filho Álvaro regressou, a tempo de passar o Natal de 1973 em casa.
-         Um natal que estava destinado a ser muito triste, mas que acabou por em certa medida traduzir uma mensagem de amor e esperança. O Álvaro quando chegou aqui foi internado no Hospital Militar. Ali esteve cerca de uma semana. Os sedativos eram fortes. Por isso o tempo em que esteve hospitalizado passou-o quase todo a dormir. Mas como não tinha ferida que se visse, mandaram-no para casa por algum tempo. O médico que o seguia, penso que era major, disse-me que enquanto ele não enfrentasse o problema não se iniciaria o processo de recuperação da perda. Recebemo-lo com a alegria possível. Quando entrou em casa quis ir de imediato ao meu escritório. Disse-me que fora ali o último grande momento de felicidade que vivera com a Catarina. Agarrou-se a mim, abraçou-me com muita força e chorou convulsivamente.
-         Não teve vontade de ver os pais de Catarina?
-         Nesse mesmo dia lá foi... (em continuação, ex. XXXVI)
in Visitados
Novembro/1999
                           

terça-feira, 14 de agosto de 2018

ALJUBARROTA E MAFRA, UMA PROFUNDA SIMBOLOGIA MILITAR


Hoje foi dia de festa na Escola Prática de Infantaria em Mafra. E a avaliar pelo 14 de Agosto que lá vivi, em 1978, foi um dia de grande orgulho patriótico. Hoje, em Mafra, comemorou-se mais um dia da unidade. E porque razão tem este dia uma carga simbólica assim tão forte? É que o patrono da EPI é o Condestável D. Nuno Álvares Pereira, o símbolo máximo do poder da infantaria, e faz hoje, precisamente, 633 anos que se deu essa grande e importantíssima batalha de Aljubarrota, no glorioso dia 14 de Agosto de 1385, na qual o Condestável foi o grande herói.

sexta-feira, 10 de agosto de 2018

A DOR QUE FERE A ALMA


...Dizia que eu e a Lucinda esperávamos que o Hélder atingisse a idade adulta para o pormos ao corrente dos factos. Ele decidiria o que fazer. Fosse o que quer que fosse, teria o meu apoio.
- Mas, suponho que isso não irá ser preciso?!
- É verdade, a sua intervenção, senhor doutor, e a de mais alguém, estão a antecipar as coisas.
- E esse alguém é...
- O anjo de quem eu há pouco lhe falava. Mas, por favor, não insistamos nesse ponto. Mostre-me a cópia que fez do tal documento.
- Pois então vamos a ele.
         Américo Afonso levou a mão direita ao lado esquerdo do casaco e do bolso interior retirou uma folha branca dobrada em quatro. À visão daquela folha, o padre entrou numa excitação febril. Bem sabia que aquele não era o documento original. Bem sabia que a mão que escrevera as linhas ali representadas não fora a mão do morgado. Mas, acreditando na competência e seriedade daquele advogado, tinha a certeza de que o que ali estivesse escrito representava um atroz sofrimento, porque foram decerto das últimas palavras que atravessaram a mente do seu querido Vitorino. Por isso, o padre José Soares disse:
- O senhor doutor tem a certeza de que o conteúdo deste documento corresponde fidedignamente ao original?
- Em absoluto. Só aí falta a assinatura do morgado Vitorino.
- Pois vamos então tentar desvendar a verdade - e o padre José Soares iniciou a leitura do documento.
            “aos quatro dias do mês de outubro de mil novecentos e dez, eu, vitorino de lourenço fernando, declaro sob minha fé que vendo a minha herdade vila de ló, delimitada a nascente por s. martinho do porto e a poente por alfeizerão, a norte por salir do porto e a sul pelo vale paraíso, ao senhor barreto raposo. ao assinar o documento, olho com esperança  para a base do armário onde guardo os livros. sem fé.”
         As lágrimas romperam a capacidade de disfarce do padre José Soares. Sempre que era obrigado a falar sobre o morgado o seu amor próprio ficava destituído de significado, a dor feria-lhe a alma. Imóvel, deixando as lágrimas correrem livremente pelo rosto, fixava aquelas palavras. A pequena frase final “sem fé” era tão triste, tão vazia, tão sofrida...(em continuação, ex. LIV)

in Quando Um Anjo Peca

Março/1998