...António
Avilar estivera a trabalhar nessa manhã no viteleiro, uma dependência da
herdade onde eram reunidos os vitelos que iam nascendo. Inesperadamente surgira
o mouro, que muito rudemente lhe ordenara que fosse para a zona da caldeira
recolher uma manada de vacas que por ali pastava. António Avilar optou em ir
pela estrada. Como a caldeira ficava fora de Alfeizerão, a caminho de S.
Martinho do Porto, António Avilar tomou a direcção que o faria passar pelo Alto
da Estrada.
Que manhã magnífica ele desperdiçara
dentro do viteleiro. O sol de Dezembro brilhava intensamente. Levando um cajado
apoiado no ombro direito e o casaco velho pendurado nesse mesmo ombro, como era
seu costume, António Avilar absorvia aquela dádiva da natureza, que era o calor
macio do sol no fim de uma irradiante manhã de Dezembro.
Subitamente, ao passar junto à
capelinha de Santo Amaro, António Avilar estancou o passo. Muito sério,
observava intensamente a capelinha. Junto à mesma estava parado o automóvel que
lhe aparecera em sonhos.
Era o mesmo. Sentiu um repentino arrepio. Os seus pensamentos
voltavam a embrenhar-se no oculto, no mistério. Mas que havia ele de fazer?
Aquele pesadelo entendera-o como um aviso. Agora que estava bem acordado, dar
de caras com o malfadado automóvel, só poderia dar uma interpretação - toda a
ameaça se começava a materializar. Rapidamente, sem voltar a olhar para aquele automóvel
de mau agoiro, seguiu em frente, na direcção da caldeira, com o espírito
perturbado...(em continuação, ex. LII)
in Quando Um Anjo Peca
Março/1998