...Homens e
carros iam parando. Álvaro percorria a picada em sentido contrário àquele em
que a coluna seguia. Caminhava com passos rápidos e firmes. A voz que lhe
segredara o aviso, fizera-o sentir tão certo da emboscada, como se ele,
invisível, ali tivesse estado, e cheio de oportunidade constatasse o inimigo
emboscado, verdade absoluta que ia anunciar ao seu comandante.
Todos o observavam cheios de
curiosidade e preocupação. Havia corações que aceleravam o batimento,
espicaçados pela adrenalina. Álvaro ia passando por homens que embora tivessem
vontade de perguntar o que se passava, não arranjavam coragem para o fazer.
Álvaro passou pelo seu amigo, o alferes Mendes. Este perguntou-lhe:
-
O que è que se passa? Porque è que vens para trás?
-
Mantém-te atento- respondeu Álvaro sem parar.
No meio da coluna, já o capitão Rebelo
se mostrava inquieto com a paragem da companhia, sem que para isso tivesse dado
ordem, quando por detrás de uma berliet surgiu Álvaro.
-
Alferes Santa Cruz, o que faz aqui? Qual è o problema
na frente da coluna?- perguntou o capitão Rebelo.
-
Por enquanto não è nenhum meu capitão. Mas mais à
frente temos problemas.
-
Como? Que raio está você p’ra ai a dizer?
-
Meu capitão, gostaria de lhe falar em particular.
-
Você está senil alferes Santa Cruz? Está a ser vítima
de ataque de paludismo?
-
Não meu capitão. O que lhe tenho a dizer è estranho,
mas pode evitar problemas à nossa companhia.
O capitão de imediato ordenou que a
cabina da berliet mais próxima ficasse vazia. Os dois nela entraram, enquanto
dezenas de olhos lhes seguiam os movimentos.
-
Desembuche homem e seja rápido. Não gosto de ver a
coluna aqui parada- dizia o comandante de companhia.
-
Meu capitão, depois daquela curva lá ao fundo temos
uma emboscada à nossa espera- disse Álvaro sem fixar o seu interlocutor.
-
O quê? Que merda è esta Alferes Santa Cruz? Pensa que
estamos a jogar aos « cowboys»? Que raio de oficial...
-
Meu capitão, depois daquela curva, debaixo de um
pequeno montículo está armadilhada uma mina anti carro. Alguns metros à frente
existe um grande tronco caído, atravessado na picada. Estão lá camuflados
muitos turras.
-
Como è que você sabe disso?
-
Não sei explicar, foi como...uma intuição- dizia
Álvaro, demonstrando sinais de embaraço.
-
Porreiro... isto è bestial... agora a guerra faz-se
por palpites ou bruxaria- dizia o capitão Rebelo bamboleando a cabeça.
-
Meu capitão, por favor ouça-me. Se ali não houver nada
pode-me instaurar um processo com o R.D.M.
-
Muito bem alferes Santa Cruz. Tenho-o como um homem de
senso e só por isso acedo a esta palermice. Se no entanto você me fizer cair no
ridículo perante a companhia...
-
Meu capitão, sem pestanejar eu corro esse risco.
-
Vamos lá então.
Ambos saíram da cabina da berliet. O
comandante de companhia chamou os outros dois alferes e disse-lhes:
-
Meus senhores, por adivinhação, pressentimento ou o
raio que parta esta maldita guerra, o vosso colega, alferes Santa Cruz, diz ter
a certeza de que depois daquela curva da picada, lá ao fundo, sob um montículo,
está armadilhada uma mina anti carro e que mais à frente encontra-se um tronco
caído, onde se escondem turras para nos montarem uma emboscada. Vocês vão
transmitir isto aos vossos homens e ai do primeiro que eu ouça rir. Quero dois
ou três atiradores especiais para dispararem sobre o montículo, se houver
montículo, quero os artilheiros prontos com as bazucas e respectivos
municiadores, para dispararem sobre o tronco. Esperemos que não seja um pau de
fósforo. Quero também os morteiros prontos. Desobedecendo às regras, a partir
daqui eu vou à frente da companhia. Se houver montículo e tronco, quero toda a
gente de imediato a disparar. Se não houver nem montículo, nem mina, nem tronco
e nem turras, prepare-se senhor alferes Santa Cruz. Por esta vez reze para que
existam inimigos. Ainda está a tempo de reconsiderar...
-
Não meu capitão, eles estão lá- interrompeu Álvaro.
-
Muito bem, vamos lá então meus senhores- ordenou o
capitão Rebelo...(em continuação, pág. 74- ex. XXI)
in VISITADOS
Novembro/1999
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