Vagueando
pela cidade os meus passos levaram-me a um lugar cheio de história, mas quase
escondido, e ignorado, do olhar da maioria dos aveirenses, muito embora esteja
a céu aberto, junto ao qual centenas de pessoas passam diariamente, sem se
darem conta da sua existência. Quantos aveirenses já ouviram falar da Fonte dos
Amores? É uma fonte, desactivada, que está num plano um pouco inferior,
relativamente ao passeio, existente mais ou menos em frente á rotunda da
«cepsa», a escassos cem metros do quartel dos Bombeiros Velhos.
A fonte é
uma construção que tem a aparência de um excerto de uma qualquer muralha, onde
existe uma inscrição e um brasão de armas. Na inscrição pode ler-se: «louvado
seja O Santíssimo Sacramento e A Virgem Nossa Senhora que foi concebida sem
pecado original».
O brasão
representa as armas dos duques de Aveiro, e encontra-se completamente picado,
reflexo do fim trágico desta casa nobre.
D. Jorge de
Lencastre (descendente da rainha D. Filipa de Lencastre, mãe da Inclita
Geração), era filho bastardo de El-Rei D. João II e Duque de Coimbra. Pôde pois
apresentar o seu filho, de 12 anos, D. João de Lencastre, neto de El-Rei D.
João II, já então falecido, na corte. O jovem ficou ao serviço do Príncipe D.
João (futuro rei D. João III), tendo El-Rei D. Manuel I lhe atribuído o título
de Marquês de Torres novas.
Aconteceu
que o então infante D. Fernando anunciou o seu casamento com a fidalga Guiomar
Coutinho. Foi quando uma voz se levantou contra este casamento, precisamente a
voz de D. João de Lencastre, alegando que Guiomar Coutinho era já sua esposa,
muito embora de forma clandestina. O rei D. Manuel I não gostou desta
intromissão e mandou prender o jovem, a quem fizera Marquês de Torres Novas,
tendo o jovem D. João de Lencastre se mantido preso durante nove anos, até á
morte do rei. Rei morto, rei posto, subiu ao trono D. João III, que devolveu a
liberdade ao jovem que estivera ao seu serviço, D. João de Lencastre. Mas não
satisfeito apenas com a devolução da liberdade, atribuiu a D. João de Lencastre
o título de Duque de Aveiro, criando assim uma nova casa de nobreza em
Portugal. D. João de Lencastre foi assim o 1º Duque de Aveiro, em Janeiro de
1547.
O 2º Duque
de Aveiro, D. Jorge de Lencastre, sê-lo-ia por pouco tempo, pois que nascido em
1548, faleceria com apenas trinta anos, no dia 4 de Agosto de 1578, ao lado de
El-Rei D. Sebastião, nas areias escaldantes do Norte de África, na Batalha de
muito triste memória de Álcacer-Quibir.
O ducado de
Aveiro prolongou-se por 212 anos, tendo tido oito duques, terminando abrupta e
tragicamente, no dia 13 de Janeiro de 1759, com a execução pública do oitavo e
último Duque de Aveiro, D. José de Mascarenhas e Lencastre, no que ficou
conhecido como O Processo dos Távoras.
D. José I,
que assinou a ordem de execução, mandou picar os brasões dos Aveiro. Por essa
razão o Brasão da Fonte dos Amores se nos apresenta no estado em que se
encontra, um sussurro de uma triste memória de Aveiro.
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