...Ao chegar a Malhal de Sula logo me
saiu ao caminho o meu pai. Ele fazia toda a questão em saber como decorrera
mais esta visita ao Conde de Cértima. Depois da primeira visita que eu fizera a
D. Rodrigo Corga, o meu pai enchera-me de perguntas, querendo saber pormenores,
para poder avaliar o meu desempenho, não como médico, evidentemente, mas como um
plebeu que pretende impressionar positivamente um nobre senhor.
- Então Joaquim, como correu? –
perguntava o meu pai, corroído de expectativa – como te tratou esse fidalgote
do Pedro Corga?
- O filho do conde não estava, meu
pai. Já abalou para o Porto para os seus afazeres das armas. Mas aconteceu uma
coisa horrível.
- Que foi? Raios partam as obras do
demo. Alguma te arranjou.
- Não, fique descansado. Nada teve a
ver comigo. Nas terras do senhor conde apareceram mortos um homem e uma mulher.
- Santo Deus… - dizia o meu pai
fixando-me com espanto.
- Segundo disseram as gentes do
conde, os infelizes estavam para se casar.
- Ainda eram novos?
- Sim, bastante novos, à volta dos
seus vinte a vinte cinco anos. E estavam mortos junto a uma velha capela,
perfurados por lâmina.
- Há aí vacas encoiradas!
- Porque é que o meu pai diz isso?
- Então não se está mesmo a ver?! Iam
p’ra se casar nessa capela e apareceu alguém que sentiu desdouro por esse
casamento se ir fazer, e os matou para limpar a sua honra.
- O meu pai acha?
- Isso está de trombas, clarinho como
a água.
- E o padre? – perguntei eu.
- O padre? Que padre?
- O padre que os ia casar?
- O padre fugiu espavorido ao ver a
sangria.
- Como fala até parece que o meu pai
esteve lá para ver.
- Mas olha, o regedor que vá falar
com o padre do Luso e logo terá o nome do matador, tão certo como estarmos
aqui.
- Bem me parece que meu pai dava um
bom meirinho.
- Dava nada, rapaz. Isto sou eu a
falar – dizia o meu pai, com uma certa vaidade escondida por tão depressa ter
atinado na razão que estava por detrás daquelas mortes...(em continuação, pág. 47, ex. XXIV)
in Alma de Liberal
Junho/2009
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