...Pelo ramo
de louro que se encontrava pendurado na parte superior daquela porta, Américo
Afonso percebeu que ali funcionava uma taberna. Olhando ainda para os três
rapazes, sentindo-se satisfeito por ter levado ao conhecimento daqueles moços o
produto do desenvolvimento científico, encaminhava-se para a porta da taberna,
quando esbarrou com alguém. De imediato lhe veio às narinas o cheiro intenso a
vinho tinto. Na verdade esbarrara com um homem, vermelho de cara, barriga
proeminente, apresentando nódoas de vinho na camisa de flanela com quadrados
castanhos e vermelhos. Era o Ti Chico Bento.
- Vossa
senhoria me perdoe - disse aflito o taberneiro, alternando o olhar entre o
jovem advogado e a coisa barulhenta e fumegante que se encontrava parada à
porta da sua taberna.
- Eu é que
peço desculpa - retorquiu Américo, tendo notado espanto também no rosto do
taberneiro - é um automóvel. De agora em diante é assim que os homens se vão
deslocar.
- Assim? E
as alimárias?
- Não lhes
há-de faltar trabalho - respondeu Américo, com um sorriso franco - diga-me, é
vocemecê o taberneiro?
- Um seu
criado para o servir. Chamo-me Chico Bento.
- Muito bem
senhor Bento. Realmente preciso que me ajude.
- É como se
vossa senhoria já estivesse servido. Em que lhe posso valer?
- Diga-me
antes demais, aqui é Alfeizerão?
- Pois não
é em outro lugar, é aqui mesmo - respondeu o taberneiro, empenhando-se em ser
solícito.
- Pode-me
dizer quem é a pessoa que mais sabe de coisas aqui da aldeia?
- De
coisas... coisas... - atrapalhava-se o taberneiro, vasculhando aflitivamente o
ar com os olhos, na ânsia de atinar com uma resposta ajustada a pergunta tão
complicada. Mas o ar não tinha as tais coisas para lhe mostrar. Pressentindo o
desatino em que se encontrava o Ti Chico Bento, Américo Afonso foi em sua ajuda
e acrescentou:
- Pode
vocemecê indicar-me qual a pessoa com quem eu posso falar sobre a herdade de
Alfeizerão?
- Sobre a herdade Vila de Ló? Será com o dono,
penso eu - respondeu o taberneiro.
- E sobre o
que aconteceu lá?
Ti Chico Bento fixou de semblante
carregado o rosto de Américo e perguntou:
- Que sabe
vossa senhoria sobre a herdade?
- Muito
pouco, mas como advogado que sou, interessei-me por esse assunto. O seu a seu
dono, não acha senhor Bento?
- Saiba
vossa senhoria, que se não fosse a minha taberna ter de estar aberta, eu sabia
muito bem o que lhe haveria de responder. Mas como os meus pipos enchem o copo
do que é querido e do amaldiçoado, só tenho de lhes vender vinho. Tudo o resto
fica-me com os botões e o travesseiro. Agora já sei o que vossa senhoria
deseja. Fale com o senhor padre José Soares. Se não for ele, ninguém mais será...(em continuação, pág. 126, ex. L)
in Quando Um Anjo Peca
Março/1998
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