- Vitorino
de Lourenço Fernando- releu o advogado- tem semelhanças.
- Decerto
que ao escrever um falso nome, o Vitorino arriscou. O outro talvez não soubesse
o nome certo do morgado ou este testou a sua capacidade de leitura. Depois vêm
as delimitações que estão trocadas com os respectivos pontos cardeais.
- Sabe
senhor padre, em tribunal este documento pode facilmente ser destituído de
veracidade. Afinal, nunca um Vitorino de Lourenço Fernando foi proprietário da
herdade Vila de Ló. Como tal nunca poderia vender o que nunca foi seu. E não
nos podemos esquecer da possível relação existente entre a data e a base do
armário.
- Eu estou
cheio de esperança e expectativa. Neste momento quase que consigo sentir a
proximidade de uma Alfeizerão ainda monárquica. Mas toda esta esperança se me
aperta no peito numa manifestação de amargura, ao sentir que o Vitorino morreu
a pedir-me ajuda e a desistir de Deus.
- Diz isso
por causa da última frase do texto- “sem fé”?
-
Exactamente.
- Ora
senhor padre, eu que não conheci o senhor morgado, estou a detectar a
subtileza. O texto não começa com a frase - “sob minha fé?” Pois se ele
escreveu “sem fé”, é o mesmo que dizer que a venda da herdade é uma mentira.
- Ò homem,
que a tristeza me atrofiou a inteligência. Mas é isso mesmo. Deus lhe pague por
esta misericórdia que me acabou de fazer. Até respiro melhor. Com a ajuda que
Deus enviou de dois lados, estou certo de que a identidade perdida dos Lourena
Fernandes voltará a florescer aqui, na sua terra.
- A dupla
ajuda divina! Eu... e o anjo- disse Américo ironicamente.
- Sim, o
senhor doutor e um anjo.
- Os anjos,
por regra, não costumam ter identidade- disse Américo ironicamente.
- E este
não foge à regra. Mas, almoçados que estamos, não quererá o senhor doutor
visitar a minha humilde capela, ler o assento de baptismo dos dois gémeos?
Penso que lá está a prova em como eles são filhos do morgado Vitorino.
- Pois
então não percamos tempo - respondeu Américo - ainda hoje tenho doze léguas
para percorrer e um rapazinho para conhecer. Estou deveras curioso.
E os dois homens atravessaram aquele
início de tarde de Dezembro, onde a esperança renascia sob um tépido sorriso do
sol…(em continuação,ex. LVI)
in Quando Um Anjo Peca
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