sábado, 11 de agosto de 2012

NA PICADA DO MAIOMBE


...Dos quatro pelotões que formavam a companhia aquartelada no Ninda, apenas um ficara para assegurar a guarda ao aquartelamento. Os restantes três tinham partido em missão de reconhecimento, sob um céu sem nuvens. Seguiam pela picada. Cada pelotão fora dividido em duas partes. Cada parte seguia por cada um dos lados da picada. Iam ali cerca de cento e cinquenta homens, envergando camuflados, ladeando uma coluna de viaturas militares, coluna essa formada por dois unimogues, onde estavam instaladas pesadas « breder ». Seguiam também três berliets e três jipes, um deles transportando um morteiro 60. À frente da coluna seguia ainda uma viatura de sapadores, para detecção e desactivação de minas.
         A picada era um caminho sinuoso de terra batida, que penetrava a densa vegetação. Os homens iam em silêncio, com os sentidos em alerta máximo e os nervos à flor da pele. Só se ouvia o ronronar dos motores das viaturas. Com as g3 bem seguras, colocadas ao nível da cintura, e os tapa chamas apontados para a floresta, os soldados caminhavam uns atrás dos outros. A meio deles seguia resguardado o comandante da companhia, o capitão Rebelo. Sendo ele o primeiro alvo a abater pelo inimigo, com aquele posicionamento mais difícil se tornava ao « in » detectá-lo. Na frente de cada pelotão seguia o respectivo alferes.
         Penetrando no interior da floresta, os soldados tinham oportunidade de conhecer bem de perto a palpitação de vida que existia em cada uma das árvores, de cada buraco, de cada carreiro da floresta que os acolhia. Imensos macacos, de muitas espécies, seguiam com olhar atento o avanço da coluna militar. Aves formando um formidável caleidoscópio, esvoaçavam perto dos homens, aliviando-lhes de certo modo os espíritos perturbados com a perspectiva de penetrarem o desconhecido.
         Álvaro sempre muito aberto às belezas naturais, ia de certa forma deslumbrado. Caminhando à frente do seu pelotão, dir-se-ia que o seu espírito direccionava três das suas partes para a guerra e uma quarta apenas estava ocupada em assimilar e registar a natureza deslumbrante que os envolvia. Álvaro sentia que caminhava num estreito corredor, entalado entre duas imensas paredes feitas de verdura. A extensão da floresta de um e outro lado da picada era compacta. Todo aquele ambiente vibrava de vida... e podia também esconder a morte. Ele não devia deixar que a exuberância florestal o iludisse, pois não ia ali como amante da natureza, mas como soldado, como guerrilheiro. Mas ele sentia que tinha capacidade para desfrutar do espectáculo que a floresta lhe oferecia, e ao mesmo tempo de sentir naquela mata um imenso e feroz inimigo. E sentia outra coisa: desde que a coluna abandonara o Ninda, de vez em quando vinha-lhe à cabeça o cenário de um grande tronco caído no chão, envolvido por capim e plantas trepadeiras, tronco esse que obstruía o avanço da companhia. E nesse tronco e área envolvente existia muito perigo...
(continua, pág. 70- ex. XIX)
in VISITADOS
Novembro/1999

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