...Foram tempos difíceis. Os
velhos guardas, sentindo-se inferiorizados pelo superior nível cultural de
alguns colegas mais novos, não perdiam a oportunidade de desdenhar deles, ou
mesmo recusar-lhes ajuda, quando os viam em situações delicadas, fruto da sua
inexperiência. No que dizia respeito aos subchefes e oficiais, era um perfeito
tormento. Contavam-se pelos dedos os subchefes, chefes de esquadra ou comissários,
que naturalmente aceitassem o facto de
terem sob o seu comando guardas, que culturalmente os ultrapassavam com facilidade. Valendo-se
do seu estatuto hierárquico de superiores aos guardas, que, no entanto, eram intelectualmente
mais evoluídos, ministravam-lhes represálias, tais como cortes de folgas ou
imposição de serviços de patrulha suplementares, para assim lhes quebrar o
ânimo, quando não era a instauração de processos disciplinares, baseados em
pequenas faltas, mas que no momento eram astuciosamente empoladas.
No início da década de oitenta
este clima era vivido mais nos dois grandes comandos do país, Lisboa e Porto, e
no comando de Aveiro, que servia como comando trampolim, onde muitos guardas
passavam anos aguardando a sua transferência, geralmente para os comandos de
Bragança, Viseu e Coimbra. Nos restantes comandos, muitos do interior, as
transferências faziam-se muito lentamente, pelo que as novas mentalidades
apenas alguns anos depois lá chegariam. Serôdio em Lisboa e eu em Aveiro, ambos
fôramos protagonistas e vítimas da lenta mudança. A mim alcunharam-me de «O
Beirão»...(em continuação, ex. XXXVIII)
in Filhos Pobres da Revolta
Março/2003
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