quinta-feira, 31 de agosto de 2017

A VIDA TERRENA ESQUECE TUDO O QUE É ESPITIRUAL

...Finalmente me encontrava no meu refúgio. Estava imensamente agradecido ao meu pai por me ter criado aquele espaço paradisíaco, que era o meu consultório, onde me achava senhor de todo o mundo, pois sabia que ao sair do conforto daquelas quatro paredes a realidade era bem diferente, dado que o mundo não era meu, mas eu é que era do mundo. E pela razão de serem as outras pessoas a condicionarem a nossa vida, pelo menos em certas circunstâncias, é que eu naquele dia me vira confrontado com aqueles dois cadáveres. Eu não estava a perceber muito bem porque razão, sendo eu médico, e tendo tido, obrigatoriamente, múltiplos contactos com defuntos, a visão daqueles dois me havia impressionado daquela forma. Reflectindo nessa questão apercebi-me então de que, embora a morte me não fosse estranha, iria estar intrinsecamente ligada à minha actividade profissional. Essa conclusão não me agradou, pois a cada morto que se cruzasse no meu caminho iria estar ligado um drama, sofrimento, e tais constatações tornariam mais pálida a minha felicidade. Mal eu sabia o número imenso de mortos que o destino resolvera colocar nesse meu caminho. Soubesse eu então o que sei hoje… estou a expressar-me incorrectamente… tivesse eu me lembrado do que hoje sei ser uma certeza, e que naquela altura apenas o havia esquecido, e a morte não se me afiguraria como uma fonte de sofrimento. Mas a vida terrena baseia-se no esquecimento de tudo o que é espiritual; e por vezes esse esquecimento é tão profundo que do espírito nem um leve pressentimento existe...(em continuidade, pág. 48, ex. XXVI)
in Alma de Liberal
Junho/2009

sábado, 19 de agosto de 2017

XX JANELA SOBRE O MEU PAÍS- PRAIA DA COSTA NOVA DO PRADO- REPOUSO DO HERÓI

Na imensidão da ria de Aveiro, no canal de Mira, que transmite beleza à já de si bela Costa Nova do Prado, entre guerreiros que para sempre descansam sobre as águas calmas, um herói repousa, recuperando energias para novas e ansiadas lutas.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

MÉDICO E DEFENSOR DO IDEAL LIBERAL


- O meu pai conhece o Francisco Carvalho?

- Nunca ouvi tal nome.

- E o Ti Chico Aduelas?

- Esse sim. É talvez o melhor tanoeiro aqui da região. Muitas das nossas pipas e tonéis fê-las ele.

- Os dois são a mesma pessoa. Pois saiba que a falecida era filha dele.

         O meu pai fixou-me, em silêncio, benzendo-se. Depois disse:

- Pobre home. Mas pelo que me tem chegado aos oividos o matador que se cuide, pois o tanoeiro, quando lhe calcam os calos não é flor que se cheire. E outra coisa se não está à espera. Perder assim um home  uma filha, é obra.

         E só depois deste diálogo pude entrar em casa. Estava cansado, ansiava por um pouco de sossego, mas ainda tive de responder ao meu pai sobre questões relacionadas com a forma como o Conde de Cértima me havia recebido. Lá lhe contei que o fidalgo percebera perfeitamente que eu era defensor do ideal liberal, mas que tal não iria impedir que eu ali continuasse a ir, na qualidade de médico, ao que o meu pai respondeu que isso não era razão para ter cuidados, pois em que outra qualidade haveria eu de entrar naquela casa, senão na de médico?!

         E deixou-me só...(em continuação, pág. 47, ex. XXV)

in Alma de Liberal
Junho/2009