sexta-feira, 26 de novembro de 2010

UMA ADVERTÊNCIA DE HÓRUS



...O palácio do faraó estava mergulhado na semi-obscuridade. O sol há muito que se pusera. Em vários pontos do palácio ardiam archotes, que transmitiam a pouca luz com que o enorme palácio era iluminado. Amenhotep, o quarto, andava embrenhado com os preparativos da coroação da sua rainha. Enquanto o não fosse, Nefertiti dormiria num quarto bem afastado do dele. O faraó escolhera algumas aias, filhas de altos funcionários do reino, vizires e hatiuás, para iniciarem Nefertiti na sua futura condição de rainha, ensinando-lhe os preceitos básicos da realeza. O palácio ficara inundado por esbeltas ninfas, que enchiam o palácio real de gargalhadas doces, bem femininas, transmitindo ao faraó um enorme sentimento de volúpia. E fora com esse sentimento que o faraó se lançara para a sua cama, ouvindo, ao longe, as aias que brincavam entre si, rindo… preenchendo a sua bela Nefertiti de sentimentos superiores, preparando-a para a coroa. Lá fora o povo cantarolava, os burros zurravam, o Nilo corria belo, as brisas do deserto passavam quentes, o Egipto acontecia…e a sua futura rainha ali estava, tão perto dele, pronta a fazê-lo feliz, a ajudá-lo a tornar-se um faraó resplandecente, poderoso, dono de tudo e de todos, do povo, do Nilo, do deserto, das pirâmides, da história… dos deuses!
Sim, claro, lá havia alguém mais poderoso no Egipto do que o faraó? Amon-Rá?! Balelas!! Ia encerrar o templo de Amon em Tebas! E o que faria com o Sumo-Sacerdote estrangeiro? E se fizesse dele um escravo!? Considerava ser uma boa opção!
E estendido na sua cama, com as mãos cruzadas por debaixo da cabeça, sentindo a brisa quente do deserto que entrava pela janela do seu quarto, o faraó sorria.
- Achas que tens motivos para sorrir?
Ao ouvir a voz que fizera tal pergunta, o faraó estremeceu de susto. Um archote existente ao fundo do quarto dava pouca luminosidade. Por essa razão o faraó saltou da cama e procurou a sua adaga. Foi então que viu uma figura tomar forma mesmo ao fundo da sua cama. Era o deus Horus, que o fitava com o seu olhar penetrante de falcão.
- Deus Horus… que susto me pregaste; mas a tua presença consola-me.
- Estás satisfeito por me veres?- perguntou Horus.
- Bastante! É bom termos na nossa presença o nosso protector- respondeu o faraó.
- Pouca protecção Horus pode dar ao faraó, se o faraó não se souber proteger a si próprio- retorquiu o deu Horus, dando ás palavras uma entoação de impotência.
- O que queres dizer com isso?- perguntou intrigado o faraó.
- Sabes Amenhotep, o quarto, na verdade a minha função é dar protecção espiritual e intelectual aos faraós, a ti. É o que estou a tentar fazer neste momento. Mas tens de ter algo bem presente: eu devo lealdade ao deus supremo Amon-Rá. Não posso pois proteger quem lhe não tem o devido respeito.
- Estás a insinuar que eu faltei ao respeito a Amon-Rá?
- Nefertiti, a sacerdotisa, vive no teu palácio?- Perguntou Horus.
- Sim, vive- respondeu o faraó secamente.
- Então eu não insinuo, eu afirmo que tu faltaste ao respeito a Amon-Rá.
- Como pode Amon-Rá dar-se ao direito de se sentir ofendido por eu lhe ter subtraído uma sacerdotisa, quando ele escolheu para seu Sumo-Sacerdote um estrangeiro!?
- Atenção Amenhotep, o quarto, pondera melhor o que dizes. Tu não estás a falar de um mortal, tu estás a questionar a conduta do deus supremo do Egipto- disse Horus em tom de desagrado.
- Tu estás equivocado, Horus. O deus supremo do Egipto sou eu.
- Cala-te desgraçado- disse Horus rispidamente- Amon-Rá é a continuação do grande criador da terra egípcia, Aton. Ao lado de Amon-Rá tu mais não és do que um grão de poeira.
- Horus, estou a ver que és muito mau diplomata. Se vieste com o propósito de me convenceres a devolver Nefertiti, só fizeste disparates.
- Assim que me acerquei do teu palácio, pressenti nos fluidos que emanas o fracasso da minha missão; mas tinha de te olhar nos olhos. Não tens perfil algum para faraó. Em ti apenas existe prepotência e arrogância. Mas se pensas que vais conseguir reinar sem a protecção de Amon-Rá, sem o apoio de MassiftonRá, prepara-te para seres o faraó dos gafanhotos do deserto, porque a terra egípcia te renegará.
- Vai-te Horus, rosto de falcão- berrava o faraó- eu sou descendente de uma alta linhagem, do mais puro e valioso que o Egipto jamais viu. Nas minhas veias corre o sangue que deu vida ás imponentes pirâmides…
- Amenhotep, o quarto, tu não passas de um momento de criação dos deuses; apenas és um sopro da sua vontade- disse Horus, ao mesmo tempo que esticou em frente, com rapidez, os seus braços musculados, originando uma onda de choque, que propagando-se pelo ar, bateu em cheio no peito do faraó, fazendo com que este fosse violentamente arremessado ao chão- vês como eu te domino tão facilmente- disse Horus, desaparecendo.
- Nefertiti será rainha no Egipto, anuncia-o a Amon-Rá; e diz-lhe também que o Sumo- Sacerdote estrangeiro vai ser meu escravo pessoal. Faço questão disso… e Amon-Rá que o impeça se for capaz. Eu sou deus na terra. Eu sou o Egipto- gritava o faraó, enquanto se levantava, humilhado.
- Divino senhor, em que te posso servir?- disse um escravo do palácio, que alertado pelos gritos do faraó, acorreu em seu auxílio.
- Desaparece daqui imbecil, antes que eu próprio te corte a cabeça- respondeu o faraó ao solicito escravo.
Horus se fora mas ainda ouvira as palavras gritadas do faraó. Levava o coração muito triste. Pela primeira vez, desde que Aton projectara o Egipto, de MassiftonRá saíra uma péssima decisão, que dava pelo nome de Amenhotep, o quarto...(em continuação, pág. 37, ex. XII)

in A CAUSA DE MASSIFTONRÁ

Novembro/2005

terça-feira, 23 de novembro de 2010

UM ERRO NA SELECÇÃO NATURAL DA MAET



Finalmente Amon-Rá saiu da sua profunda reflexão e dirigiu-se para uma zona de MassiftonRá, onde os deuses se encontravam concentrados. Amon-Rá dirigiu-se ao ancião deus Aton.
- Aton, na tua infinita experiência, algum momento houve em que te tenhas sentido menos capaz de lidar com um problema que os homens te tenham colocado?
Todos os deuses fixaram Amon-Rá com perplexidade. Mas que raio de pergunta era aquela?
- Não Amon- respondeu o deus Aton imediatamente - os homens nunca foram, nem nunca hão-de ser capazes de criar embaraços a um deus. Os homens são um enorme amontoado de carne e ossos, iluminados apenas por uma centelha mental. Ao contrário, o deus, todo ele é mente, propagação constante e infinita de energia; no entanto, quando o Egipto sofreu a invasão dos Hicsos, tenho de reconhecer que tive algumas dores de cabeça, que, bem vistas as coisas, foram resultado apenas de um maior fluxo de trabalho, no sentido em que tive de despender de muita energia para ajudar o faraó a manter intactas as raízes da estrutura mental do Egipto, perante as influências culturais do povo invasor. Mas só isso. Porquê essa pergunta?
- E se esse homem que te colocasse um problema fosse o faraó ? – Insistiu Amon-Rá em questionar Aton.
- Não te percebo Amon. Os faraós não colocam problemas aos deuses. Os faraós anseiam pelas bênçãos dos deuses!
- Então estamos na presença de um faraó que nunca o deveria ter sido- exclamou Amon-Rá.
- Referes-te a Amenhotep, o quarto?- perguntou o deus Aton.
- Exactamente. Amenhotep, o quarto, teve a ousadia de subtrair uma das minhas sacerdotisas do templo de Tebas, e levá-la para o seu palácio. Quer fazer dela a sua rainha.
- Perdão- disse o deus Horus, com a incredulidade estampada no seu rosto de falcão.
- É o que tu ouviste, Horus. O faraó, a quem tu deves proteger e aconselhar, está a cometer esse acto. Foi-me transmitido pelo meu Sumo-Sacerdote Masahemba; e o sifto encarregue de recolher as emanações, apenas encontrou sentimentos de raiva. Teve de sair do templo rapidamente. Eu sei que tenho de tomar uma atitude, mas qual? O faraó não é um humano qualquer! Ele é o rosto do Egipto.
- Agora compreendo a tua pergunta- disse Aton- quando eu projectei o Egipto, dei aos faraós o poder psíquico necessário para estarem alguns degraus acima dos restantes homens, com a finalidade de os homens que formam o povo egípcio reconhecerem no faraó um ser superior, iluminado, e por conseguinte de se sentirem subjugados perante o seu superior intelecto, e como tal, o aceitarem como o seu guia. Mas não disse aos faraós que eles tinham o direito de se equipararem aos deuses; até porque não se equiparam! Os faraós são mortais!
- Mas consideram-se os deuses na terra- exclamou Amon.
- E foi assim que eu quis que eles fossem sentidos. Mas o faraó ser deus na terra é uma coisa; o faraó ser deus no seio dos deuses… aí, alto! O faraó em funções tem de ser colocado no seu lugar ou então destituído do trono.
- Destitui-lo do trono seria uma atitude demasiado prepotente da minha parte- disse Amon- porque, o faraó, não está a colocar em risco a integridade do Egipto ao roubar uma sacerdotisa ao templo. Ele apenas está a pôr em questão a sua submissão a mim. Amon-Rá é um deus amado, por isso quero continuar a sê-lo.
- Mas é um mau indicativo o facto do faraó ter a ousadia de te provocar de uma forma tão directa. Se a sua índole lhe permite fazer isso com o deus supremo, o que não poderá ele fazer com o seu povo?
- Essa observação é bastante pertinente- exclamou Amon-Rá- mas tudo ao seu tempo. De momento apenas lhe tenho de fazer sentir o quanto estou aborrecido. Ele é jovem, pode ser que reconsidere.
- E tu aceitarias de novo a sacerdotisa, depois de ter sido tocada por um homem?- perguntou a deusa Ísis.
- Caso o queira, pode, pois o homem que lhe tocou foi o faraó, que tem a nossa chancela divina- respondeu Aton.
- Bem, sendo assim, vou actuar com diplomacia. Horus, tu que estás encarregado de apoiares os faraós nas suas missões de governação, ficas incumbido de contactares o faraó Amenhotep, o quarto, e de perceberes as razões que o levaram a cometer tal loucura, bem como de o persuadires a devolver a sacerdotisa Nefertiti. E por agora chega. Hoje a minha alimentação vai ser de qualidade inferior, já que apenas me vou alimentar de emanações de simples oráculos do povo, pois o tabernáculo do templo não me foi benéfico, o que à partida me traz um certo cansaço.
E Amon-Rá retirou-se. Os restantes deuses ainda conversaram um pouco mais sobre o assunto, tendo chegado a um consenso: poderia ali estar a germinar um sério problema!
Aton, o deus ancião, estava perplexo. Fora ele o criador da força mental que estava na base da existência do Egipto. Como tinha sido possível que a selecção natural da Maet tivesse permitido que aquele indivíduo chegasse a faraó? Pela primeira vez, o seu estruturado projecto da criação demonstrava uma falha. Mas, ele já cumprira a sua missão. Ao ter sido substituído por Amon-Rá, Aton sentia que o lugar do deus supremo continuava a ser muitíssimo bem ocupado. Amon-Rá tinha capacidade para fazer frente a este desafio, com que, ele próprio, Aton, nunca se vira confrontado… felizmente! (em continuação, pág. 33, ex XI)

in A Causa de MassiftonRá

Novembro/2005

sábado, 6 de novembro de 2010

PARA LÁ DA MÚSICA



A música, e não a política, é que deveria tomar conta dos destinos da humanidade. Principalmente, porque a música, para se fazer notar, não necessita de riqueza material. A sua riqueza é a alma. E a alma está a fazer falta à humanidade.