terça-feira, 30 de setembro de 2008

AVEIRO, 16 DE MAIO DE 1828 (II PARTE)

Na fotografia, tirada pelo António Henriques (este foi o melhor plano possível), é apresentada a placa da Rua Batalhão Caçadores 10, que em letras já muito sumidas, como sumida está a memória dos aveirenses, diz o seguinte: «Batalhão de Caçadores 10, a primeira unidade militar que levantou o grito de revolta contra a tirania absolutista em 1828»




Possuído por um profundo sentimento de revolta, por ver que a monarquia absoluta estava de regresso a Portugal, com a dissolução da câmara de deputados em Lisboa, na qual tivera assento, o Desembargador Joaquim José de Queiroz, na sua casa no Lugar de Verdemilho, em Aveiro, planeou um golpe que travasse os intuitos absolutistas do infante D. Miguel, agora regente do reino de Portugal, e da sua mãe, a rainha viúva D. Carlota Joaquina.
Nesse sentido reuniu-se com proeminentes personalidades aveirenses, de forma a persuadi-los a integrarem um movimento de cariz revolucionário. Á causa aderiu também o Batalhão de Caçadores 10, de Aveiro.
Em pouco mais de dois meses, do planeamento se passou à acção.
Assim, no dia 16 de Maio de 1828, em Aveiro, que como cidade já contava sessenta e nove anos, pela manhã, os aveirenses foram acordados com os sinos a tocarem a rebate. A população veio para as ruas e aglomerando-se a todo o comprimento do canal central, gritaram bem alto «vivas » à infanta D. Maria (futura rainha D. Maria II), e morras a D. Miguel e à rainha megera D. Carlota Joaquina, numa corajosa ostentação de desagravo aos ideais absolutistas, e de total lealdade ao pensamento liberal. O povo viu então o Batalhão de Caçadores 10 embarcar em moliceiros e outros barcos, com destino a Ovar. Muito do povo embarcou com os militares do batalhão de Aveiro.
Chegados a Ovar, marcharam para o Porto, onde outras unidades militares se juntaram ao Batalhão de Caçadores 10, tendo sido criado um governo provisório de índole liberal.
As cartas tinham sido lançadas. O liberalismo marchava triunfantemente.
No entanto, a loucura que a revolta levou ao sangue que, forte, corria nas veias, retirou esclarecimento ás mentes, que assim subestimaram o poder da reacção absolutista.
Para o liberalismo se implementar eram exigidos mártires, e esses ainda não existiam. Não estava longe a sua hora. (continua em próxima edição)

sábado, 27 de setembro de 2008

AVEIRO, 16 DE MAIO DE 1828


Talvez por, neste nosso país que é Portugal, me sentir privilegiado, por pertencer ao grupo dos portugueses vivos que viveram a nossa revolução de Abril, no meu caso, na minha querida cidade de Coimbra,
é que decidi escrever sobre esta data,


que algo trouxe a esta maravilhosa cidade de Aveiro, há 180 anos. Pedi então ao meu amigo António Henriques que se munisse da sua máquina e partíssemos em busca da história, pedido a que ele acedeu pronta e entusiasticamente. E das catacumbas da história desenterrámos o registo fotográfico que se vai apresentando. Pode parecer tétrico o que em Aveiro existe que se relacione com a questão, mas é precisamente o que existe. Nada mais!
Corria o ano de 1828. D. João VI, rei de Portugal, falecera havia dois anos. O sucessor directo ao trono, D. Pedro IV, acumulava o trono do Brasil, ao qual dera a independência havia seis anos. Portugal estava entregue à regência de sua irmã, a infanta D. Isabel Maria. No entanto, o seu governo carecia de uma mão firme, para colocar ordem nos seus ministros liberais, entusiasmados com as mudanças implementadas pela recente Carta Constitucional ainda do tempo do falecido monarca D. João VI. Nesse sentido, D. Pedro IV, do Brasil, resolveu chamar ao reino o seu irmão, o infante D. Miguel, que se encontrava exilado na Áustria, ainda por ordem do já falecido pai de ambos, depois dos fracassados golpes absolutistas que ficaram conhecidos como «Vilafrancada» e «Abrilada».
E assim, em Fevereiro de 1828, D. Miguel chegou a Portugal, com a obrigação primeira de jurar a Carta Constitucional, que fez...mas jurou falso. E a primeira prova das suas verdadeiras intenções, aconteceu em Março desse ano, um mês depois de ter chegado a Portugal, ao dissolver em Lisboa a câmara de deputados.
Nessa câmara, em representação de Aveiro, tinha assento, como deputado, o Desembargador Joaquim José de Queiroz, com uma prestação bastante activa, que em muito se chocou contra o cariz profundamente absolutista da rainha viúva, D. Carlota Joaquina.
Câmara dissolvida, deputados recolhidos às suas respectivas regiões. O Desembargador Joaquim José de Queiroz regressou a Aveiro, à sua casa do Lugar de Verdemilho. No entanto, ultrajado com tão vil acto, corria-lhe nas veias o sangue apressado. (continua)

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

CONJUNTO TEYA


A minha juventude deu-me a conhecer gente que me fez extremamente feliz. Gente como os meus colegas de palco no grupo de teatro amador «Os Tibúrcios», a que já fiz alusão, ou gente como a rapaziada que comigo foi cúmplice em alguns muito bons momentos de palco...na música.
Refiro-me concretamente ao conjunto «Teya», da Cortiçada, ali bem pertinho de Campo de Besteiros, no Concelho de Tondela.
Corria o ano de 1977. Tinha eu então 21 anos de idade. Embora eu não fosse o baterista efectivo do grupo, foi comigo à bateria que o Teya colocou no seu reportório musicas dos Credence Clearwater Revival e do Carlos Santana. E tentámos tocar Deep Purple. E digo «tentámos», porque Deep Purple é sinónimo de Júpiter, se Júpiter tivesse sido o deus da música.
Com o Fernando Ferreira nos teclados, o Altino na viola ritmo, solo e voz, e o Carlos Ferreira no baixo, puxando pelos amplificadores Farfisa e puxando por mim, e eu por eles, vimos deliciados a receptividade do público. Fizemos furor.
Era uma época em que ainda se não sabia o que era uma mesa de mistura, pelo menos ao nível do nosso grupo, um conjunto não muito abastado. Cada instrumento tinha a sua amplificação individualizada de todos os outros. Para a voz existia uma amplificação própria. E claro, a bateria era pura acústica. As baquetes tinham de ser duras nas peles. O pé precisava de ser rijo no bombo. O meu bombo era bem audível.
O Teya fez escola naquela região. Os que hoje estão na casa dos cinquenta, e que ainda por ali vivem, recordam com saudade o conjunto que lhes fazia agitar o sangue nas veias. Ainda hoje, quando recordo o Teya, sinto o batimento cardíaco acelerar.
Se há coisas de que me orgulho, uma delas é de ter conseguido com que aqueles musicos extraordinários me tivessem aceitado no seu seio, é a de ter tocado, com sucesso, NO TEYA.

sábado, 20 de setembro de 2008

MANHÃ DE HISTÓRIA

Acabei de chegar a casa. Na companhia do meu amigo António Henriques, ele munido da máquina fotográfica e eu do roteiro mental, percorremos alguns locais de Aveiro, em busca de quatro pontos específicos, espalhados por Aveiro, interligados entre si por uma data histórica, triste, mas heróica, que nos fala de liberdade e morte. Uma data, um acontecimento, barbaramente esquecido, que hoje tentámos desenterrar das fundações profundas da história, e que, brevemente, traremos à luz do dia e ao conhecimento dos homens, dos aveirenses, que sem qualquer respeito pela memória colectiva e local, o esqueceram.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

O DESPERTAR DO APELO ÁS LETRAS


Tudo na vida tem um principio. A própria vida teve um principio. E cada um de nós tem um momento certo, o primeiro, que deu início ao desencadear dos segundos, esses milhões, que nos trouxeram até a este preciso momento. O meu primeiro segundo, aconteceu algures, nas primeiras horas do dia 30 de Abril de 1956.
Mais fácil é para nós determinarmos o momento exacto do nosso nascimento, do que definir o primeiro momento dos muitos nascimentos que em nós aconteceram. Porque em nós muitas coisas nasceram, entretanto.
Por uma casualidade, sei o momento certo em que em mim nasceu o amor pelas letras, muito embora o já tivesse, inconscientemente.
Foi num dia da primavera de 1973. Frequentava então o antigo 4º ano dos liceus, no Liceu D. João III, em Coimbra. Existia um professor de português, orientador de todos os professores daquela disciplina no liceu, e que por sinal era o meu professor de português- o Dr. Margarido. E o Dr. Margarido, não sei porque razão, resolveu dar o mesmo tema a todas as turmas do 4º ano
para que fosse feita uma redacção. Já não me lembro qual era o tema. O que recordo, com muito orgulho, é que a minha redacção foi a que teve a melhor nota do liceu.
Para um adolescente, que eu era, este acontecimento teve uma importância crucial para a minha vida. Não que dele viesse a obter algum proveito económico, que a vida não me levou por esse caminho, mas preencheu-me o ego, e fez-me ver que, se calhar, não tinha sido uma mera casualidade o facto de eu ter redigido a melhor redacção. A tal ponto me deu força, que um mês depois eu estava a criai o meu primeiro livro- O Primeiro Amor da Adolescência, era o seu título. Perdi-lhe o rasto, mas não mais o esqueci. Eram oitenta páginas, que demoraram três meses a ser escritas.
Não mais me desliguei da lapiseira e do papel. No entanto, por varíadissimas razões, a chama da escrita criativa apagou-se do meu intelecto. Até aos meus quarenta anos. Aí senti uma pressão enorme a crescer, a qual tinha de libertar. Em Dezembro de 1996 comecei a escrever...e não mais parei. Os meus mundos, tenho-os visto ganhar consistência. As personagens têm-se multiplicado. Hoje são uma multidão que me acompanha e exige mais companhia. Editar?
Em Portugal, os autores pertencem a uma elite da qual eu me encontro a uma incomensurável distância. Sou um anónimo sem a obsessão de se tornar conhecido. Acredito profundamente que um dia irá existir um descendente meu, que se irá envolver com editoras, tendo por base os romances que vou compondo.
Por agora, do meu trabalho, na solidão do meu canto, obtenho a enorme felicidade que sinto na interacção que mantenho com o António Avilar, ou o Álvaro Santa Cruz, o Serôdio Velasquez, o Masahemba, ou ainda o doutor Joaquim Lopes, a Maria Clara, o Jack Horn ou o Mão de Mula, algumas das muitas personagens que me fazem rir, chorar...sentir-me realizado!
Obrigado Dr. Margarido.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

CORAL INFANTIL VERA CRUZ



Ao chegar a Aveiro, em 1985, trazia comigo uma grande saudade: dar continuidade à minha actividade de musico. A última vez que me vira envolvido pelas vibrações de um amplificador, e que sentira nas mãos a resistência da pele de uma tarola, já fazia três anos. Por um capricho do destino (ou talvez não), fui, pouco a pouco, me dirigindo para o local de onde surgiria a oportunidade de voltar a tocar. Demorou quatro longos anos, mas aconteceu. Conheci o Tó Zé e a Elsa. E palavra puxa palavra chegámos à conclusão que tínhamos algo em comum- o gosto pela execução musical. No entanto, não concebíamos formar um grupo musical. Esse não era um projecto viável. E foi nessa base que criámos algo muito mais enriquecedor. Fundámos o Coral Infantil Vera Cruz. Conseguimos convencer pais, que tivessem filhos em idade escolar, que já soubessem ler, a experimentar porem os seus filhos a cantar. E, evidentemente, que a ideia agradasse ás crianças. E em pouco tempo tínhamos um grupo de cerca de trinta crianças, com quem poderíamos trabalhar. Enquanto escolhíamos os miúdos, fazendo uma pré selecção, tratámos de encontrar uma teclista e um guitarrista. E ela apareceu. Aí tinhamos nós então o grupo formado- o Tó Zé na viola baixo (substituído várias vezes pelo Nuno Albuquerque ou pelo Carlos Ferreira), e nas teclas, o Nando na viola ritmo e solo, a Paula nos teclados (posteriormente substituída definitivamente pelo Pedro), a Elsa como maestrina e eu na bateria.
O nosso objectivo era, e foi plenamente conseguido, fazermos letras para as adaptar a várias músicas. E as músicas foram surgindo. Tocámos temas da pop, reggae, rock, blue e country, e músicas de natal. A Elsa escreveu algumas músicas inéditas.
A Elsa Martins, uma compositora extraordinária, uma ilustre desconhecida.
Fizemos ainda um medley composto por músicas do cancioneiro aveirense-13 minutos ininterruptos de música popular da ria e dos moliceiros, que muitas horas de ensaio nos levou, até estar pronto a ser apresentado.
A nossa primeira actuação aconteceu no dia 20 de Dezembro de 1989, e a última no dia 17 de Junho de 1995. Foram cinco anos e meio de espectáculos deliciosos, momentos de muita magia. Já por muito menos vi imensa publicidade.
Considero que o Coral Infantil merece ser recordado neste meu espaço, não só pelo óptimo trabalho que todos executámos, mas, principalmente, pela dedicação e empenho que todas as nossas crianças tiveram, tanto nas incontáveis horas de ensaio, como no entusiasmo que sempre demonstraram em palco.
Essas crianças, hoje homens e mulheres, com variadíssimas actividades, a quem perdi o rasto a quase todas.
Homens e mulheres, que sei recordarão com saudade, com carinho, e decerto um brilhosinho nos olhos, o Coral Infantil Vera Cruz, ao qual deram alma.
A todos, por onde quer que andais, o meu obrigado pelo brilho que emprestaram ás horas que eu, sentado atrás da tarola, vivi, marcando o ritmo e o compasso do encanto que de vós emanava.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

CIDADE AGRESTE


vida agreste, vida sem cor, esta cidade
que me seduz e embala, me amortalha
e sufoca o pensamento de ansiedade
me dá horizontes de muralha

em ti vejo alegres corações
que passam, felizes cantando
carregados de imensas emoções
sorrindo, mordazes, amando

porque razão me és tão hostil
serei eu filha de um vento norte
que a mim trouxe angústias mil
gélido, pai de pouca sorte

ou então presença que a ti perturba
por ser apenas eu, sem heranças, mas sem donos
que se distingue nesta envolvente turba
que acordada, permanece em profundos sonos

ir-me-ei embora um dia, cidade minha
quando do meu peito a solidão se afaste
e no meu rosto surja o porte de rainha
vencida a turba, que a meus pés se arraste

mundo não falta, onde eu me torne ardente
me perturbe de amor, e me faça calma
aí serei eu, aí serei gente
lugar de sonho, o reino da alma