quinta-feira, 31 de outubro de 2019

XXIX JANELA SOBRE O MEU PAÍS: QUANDO O SOL NASCE NA COSTA NOVA DO PRADO


Costa Nova do Prado, sete e meia da manhã.
Quando o sol nasce é para todos, mas para alguns o sol nasce para iluminar o descanso, e para outros nasce para iluminar o trabalho. Falta de sol nenhum dos dois grupos tem!

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

PERTENCER A «ESSA GENTE»


...Não mais entraria em conflito com aqueles homens, até porque cada vez se viam menos. Durante muitos anos eles haviam sido considerados os maus da sociedade. Os novos agentes recebiam essa atroz herança assim que se alistavam nos quadros da PSP. Então significava que a revolução de Abril não eliminara todos os maus, pois julgando pela postura do povo relativamente aos policias pós 25 de Abril, os maus de outrora continuavam a actuar nas ruas do nosso país. Eu e o Serôdio pertencíamos a esse grupo repelente, a «essa gente» específica, expressão muito infeliz que por algumas vezes ouvi ser proferida por dignos cidadãos, quando se referiam aos agentes policias. Mas, se por uma improvável hipótese nós aceitássemos esse papel, não haveria ao menos a possibilidade de se colocar a pergunta: e do outro lado? Na parte externa da policia, existiam só santos? A esta pergunta, anos depois veio a resposta. Sumptuosas figuras, banhadas pela ilustre luz da cultura e sólida formação moral, em 1986 afiavam os caninos venenosos, preparando-se para a grande batalha que estava prestes a começar. O seu alvo? Nós, os maus da sociedade; nós, infelizes adolescentes do 25 de Abril de 1974, que naquele sopro de liberdade muito longe estávamos de imaginar que, para nós, aquele inebriante momento de um voo sem fronteiras se tornaria num prolongamento de culpas alheias. Sim, nós, novos policias de 1983...(em continuação), ex. XLI
in Filhos Pobres da Revolta

domingo, 6 de outubro de 2019

REFLEXÃO SOBRE A CONDIÇÃO DE SER POLÍCIA NA DITADURA


Os seus colegas antigos, pobres diabos, haviam sido marionetes, que manipulados pelo regime fascista foram seres que, numa extrema infelicidade, se haviam arrastado por longos quarenta e oito anos de ditadura, sofrendo as agruras de uma impiedosa hierarquia, que lhes sugou o amor próprio, a individualidade, os proibiu de pensar, os privou do descanso e da relação com a família. Enfim, foram homens sem direito à cidadania e privados de vida própria. Eram estas vítimas, agora à beira da reforma, merecedores de mais afrontas? Deixá-los falar, coitados! No fundo desdenhavam, apenas para esconderem a vergonha que sentiam por nunca terem tido coragem de questionar as palavras dos chefes. Mas, os tempos também eram outros. Até os próprios elementos da PSP, do tempo da outra senhora, poderiam ter constas a prestar à PIDE, caso discutissem as ordens recebidas. Podia assim a sua atitude ser interpretada como actuação de agitador, e isso poderia sair-lhes caro. Sobre Portugal pairava a aterradora e sinistra sombra do Tarrafal de Cabo Verde...(em continuação, ex. XL)
in Filhos Pobres da Revolta