terça-feira, 30 de dezembro de 2014

O 15º ANO DO SÉCULO XXI E DO III MILÉNIO

Amanhã as marcas do belo espumante muito português vão assistir, extremamente satisfeitas, ao escoamento das suas produções. Em cada canto deste velhíssimo país, á meia noite, as rolhas de cortiça vão alegremente saltar, e o liquido generoso vai correr. Entra 2015!
E é focado nessa imagem, e com a mente fechada ao fluxo de torrentes de tristeza que nos amarguram a todos, que estes futrica do mondego e poeta do penedo, as mentes que melhor ou pior vão preenchendo este blog, desejam a todos quantos nos visitam uma passagem de ano excelente, e um 2015 pleno de felicidade.

Obrigado pela vossa sempre presente e simpática visita! 

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

DO FUNDO DO SEGREDO UMA EXPRESSÃO ENIGMÁTICA

...Eu estava em brasa, mas seguindo o sábio conselho do meu pai, preferi ficar-me por ali, muito embora eu tivesse a percepção de que não conseguira disfarçar a faceta liberal do meu ponto de vista político. Olhei então para um relógio de parede, mais um, existente numa das paredes da sala de jantar. Marcava oito horas. Queria sair dali o mais depressa possível, tentando, no entanto, que o Conde de Cértima visse em mim o seu médico e nada mais do que isso.
- São oito horas. Vossa excelência, senhor conde, ir-me-á desculpar, mas tenho de me ir embora.
- Durma cá, doutor Joaquim Lopes. Mando que a Maria do Carmo prepare um dos quartos de hóspedes.
- Fico muito agradecido a vossa excelência, mas meus pais ficariam em cuidados. E ainda hoje quero estudar uns apontamentos que tirei sobre uns desarranjos intestinais que afligem as pessoas de um só lugar.
- Então mandarei que dois dos meus homens o acompanhem. Os caminhos hoje em dia não são seguros.
- Agradeço a amabilidade, excelência. E não me esquecerei das aplicações dos unguentos nesse braço.
         E pouco depois encontrava-me a subir para a minha caleche, tendo por companhia dois fortes mocetões, cada qual no seu cavalo. A governanta Maria do Carmo acompanhou-me até à caleche. Aproveitando o facto de tanto o conde, como o filho, não se encontrarem ali, fiz uma pergunta à governanta:
- Senhora Maria do Carmo, poder-me-á responder a uma pergunta?
- Se eu souber a resposta, lha darei, senhor doutor – respondeu a governanta um pouco intrigada.
- É sobre a senhora D. Maria Clara.
- Que tem a filha do senhor conde? – perguntou ela, com um semblante de relutância em falar sobre aquela bela mulher.
- É precisamente isso que eu gostava de saber. O que tem aquela bela senhora, que faz dela o rosto da tristeza?
- Talvez lhe não fizesse mal que o senhor doutor a visse, um dia destes, com os olhos de médico.
- Não me pareceu que sofra de alguma doença.
- Maleita é decerto. Talvez não seja do corpo, mas quem sabe… talvez a palavra de um médico trouxesse a cura tão desejada.
- Quer-me dizer que algo há!
- Boa viagem, senhor doutor. Que Deus permita que venha a esta casa mais vezes – disse-me a governanta, fixando-me bem nos olhos, dirigindo-se de seguida para a casa do seu amo.
         Esta pequena conversa com a governanta, trouxe-me a certeza de que algo existia naquela casa, que fazia com que aquela esbelta mulher, Maria Clara, quase se desvanecesse no seio daquela família.
         Durante toda a viagem pensei na Maria Clara. Apercebi-me então de que estava completamente absorvido na imagem daquela mulher. Sorri para comigo mesmo. Em Coimbra embeiçara-me por duas tricanas, aventuras que terminaram com tremendas nódoas negras feitas por varapau de fútricas ciumentos. Mas, na verdade, ainda não existira nenhuma mulher que tivesse retido a minha atenção. Talvez para isso tivesse contribuído, em muito, a minha educação eclesiástica. Já ia sendo tempo de os assuntos do coração me trazerem alguns afazeres. Os meus pais já me haviam sondado sobre isso, tendo até adiantado nomes de raparigas, filhas de outros lavradores. Mas ao homem não é dado o poder de comandar a sua vida, muito embora ele julgue que sim. O ar cândido, belo e sofredor de Maria Clara me havia impressionado, e acho que tinha despertado em mim algo que até ali estivera adormecido.
         Algum tempo depois vim a saber que, após a minha saída, Pedro Corga, o filho do conde, me considerou um perigoso pedreiro-livre, achando não ser benéfica a minha presença naquela casa, dado eu me poder transformar numa má influência para a sua irmã, que ele bem tinha reparado na intensidade com que eu a olhara, tendo-lhe o pai respondido que ainda era o chefe daquela casa, como tal, eu entraria ali como médico e nada mais do que isso; e caso eu tivesse outras intenções, ele, à parte a idade que já tinha, ainda possuía autoridade para me pôr no meu lugar e saber defender a filha de más influências.

         Pedro Corga, oficial do exército, era um homem de aguçado olhar e raciocínio certeiro...(em continuação, pág. 38, ex. XVII)
in Alma de Liberal

Junho/2009

domingo, 21 de dezembro de 2014

TEMPO DE NATAL

A todos os que nos lêem ou simplesmente visitam, este blogue deseja um Natal muito feliz e rico em amor, muito amor, e que em casa de cada um se realize a tradição que no respectivo país faz bater mais forte os corações. Em minha casa, aguardando pelo Pai Natal, estará presente o eternamente português bacalhau, como acontecerá na esmagadora maioria dos lares portugueses.
Que seja possível a paz entrar onde faz falta, e que o amor tenha força para terminar com todo o tipo de injustiças. Eu sei que este desejo é um lugar comum, mas, infelizmente, a guerra e a tragédia também o são. Se o nosso desejo neste lugar comum que é paz, por tanto ser desejado, se tornasse realidade para um quilómetro quadrado que fosse, não me importaria em ser repetitivo.
Boas Festas para todos vós.

domingo, 14 de dezembro de 2014

O CONDE DE MONTE CRISTO

Muito embora o enredo de «O Conde de Monte Cristo» seja sobejamente conhecido, nunca tinha lido o livro, que me surgiu nas mãos, quando fazia uma arrumação. E fui lê-lo. Uma desilusão! Na minha opinião este será um dos poucos casos em que a cinematografia suplanta a criação escrita. A idéia é muito boa, mas é só. E talvez por isso o livro tenha tido tanto êxito no cinema. Literáriamente a construção é muito fraquinha. Dá a sensação que o livro foi escrito a despachar. Sucedem-se numa cadência demasiado rápida, tanto  as armadilhas que foram montadas ao conde, como o decurso da sua prisão, e depois as várias etapas de vingança que o Conde de Monte Cristo vai congeminando, para derrotar os seus inimigos. Na realidade Edmond Dantés bem pode agradecer aos realizadores de cinema o facto de ter ficado tão conhecido. Que Alexandre Dumas me perdoe.

sábado, 6 de dezembro de 2014

ENTRE MASSIFTONRÁ E SETH, RASTEJA UM TEKHAIB FRIO E IMPLACÁVEL

...O Tekhaib era um enorme escorpião, que quando tomava a forma de um ser humano, dava lugar a um homem de envergadura respeitável, proeminentes músculos peitorais e fortíssimos braços e pernas. O rosto era rectilíneo, com uma enorme boca e o olhar frio, não transparecendo qualquer tipo de bondade.
- Tekhaib, que opinião tens sobre as notícias trazidas pelos obreiros?
- Meu amo das areias, se existe uma desavença entre Amon-Rá e o faraó, isso quer dizer que ambos estarão abertos a uma solução que resolva a questão para um dos lados- dizia o Tekhaib com um sorriso malicioso.
- Explica-te melhor, meu escorpião eleito.
- Se Amon-Rá tiver uma oportunidade de reaver a sacerdotisa, não a perderá. Se por outro lado, ao faraó for dada a oportunidade de eliminar Amon-Rá…
- Isso é um disparate, Tekhaib. Nenhuma força existe, capaz de aniquilar o deus supremo. Se essa força existisse eu já a teria utilizado.
- Peço perdão, meu amo das areias, pela minha estupidez.
- Estás perdoado, porque sei que muito longe te encontras de imaginar o poder de um deus. Não passas de uma insignificante criatura rastejante…
- Insignificante, mas que tu utilizas com muito proveito, meu amo das areias- interrompeu o Tekhaib, falando com sarcasmo.
- Sim, já sei que te sentes muito orgulhoso por seres o meu ajudante mais próximo, mas tem cuidado com esses sentimentos de grandeza. Aqui, eu sou o cérebro e a vontade. Tem isso sempre bem presente Tekhaib.
- Eu tenho, meu amo das areias, eu tenho- disse o Tekhaib, fazendo uma vénia em sinal de submissão.
- Se até agora não tive qualquer intervenção no conflito existente entre o deus supremo e o faraó, vou passar a ter, e fazer por criar maior ódio entre os dois. Ambos me desprezam. A ambos levarei notícias minhas e aproveitar-me-ei o mais que puder de toda a confusão que vier a gerar. Há mais algum pormenor que eu ainda não saiba?
- O faraó mudou de nome, proibiu o culto de Amon-Rá e vai impor a adoração do deus Áton. Enquanto não tiver criado um templo a  Áton na nova cidade que quer construir, ele próprio irá adorar o deus ancião no seu próprio palácio, pelo que mandou eleger um sumo sacerdote.
- O faraó mandou que um escriba fosse eleito a sumo sacerdote para o culto a Áton, no seu próprio palácio?!!- dizia Seth, sorrindo rasgadamente, com os olhos de águia a brilharem- mas essa é uma óptima notícia.
- Porquê, meu amo das areias?- perguntava intrigado o Tekhaib.
- Porquê, meu escorpião eleito? Porque esse sumo sacerdote serve como ponto da grande discórdia. Esse sumo sacerdote vai morrer… ou melhor, vai ser morto ás ordens de Amon-Rá.
- E achas que Amon-Rá o vai matar?
- É claro que não.
- Então?!!!
- Então… vais tu matar esse sumo sacerdote, dando a entender que  essa foi a vontade de Amon-Rá.
- Já percebi. Aí está o que se chama uma grande bronca. Mas, meu amo das areias, e o outro?
- Qual outro Tekhaib, qual outro?- perguntava o deus Seth um pouco impaciente.
- O outro Sumo Sacerdote.
- Esse não tem qualquer importância para mim; e mais cedo ou mais tarde, o faraó acaba por matá-lo.
- Mas os obreiros disseram que o próprio Amon-Rá faz questão de o defender.
- Faz?- perguntou Seth intrigado- porquê?
- Esse tal Sumo Sacerdote era filho de um estrangeiro que deu a vida defendendo a honra de Amon-Rá.
- Ai sim? Amon-Rá defende um estrangeiro e expulsa um deus de MassiftonRá? Um igual a si? Nesse caso, esse Sumo Sacerdote adquire uma súbita importância. A esse terei o prazer de matar e de o anunciar a Amon-Rá. Está na hora de eu ir fazer uma visita a MassiftonRá.
- Meu amo das areias, lembro-te de que lá não és bem vindo. Corres sérios riscos.
- Ouve meu escorpião eleito, um deus nunca corre riscos, nem graves nem leves. No máximo, poderá um deus ser vexado… mas isso já eu fui há muito. Por isso vivo nesta espelunca, enquanto os meus semelhantes se refastelam no paradisíaco ambiente de MassiftonRá. Assumes o comando deste covil. Eu vou-me divertir.

         E o deus Seth partiu em direcção a Tebas, espalhando a sua funesta sombra, mistura de águia e chacal, apelando a todas as forças do mal que lhe dessem apoio e imaginação para a empresa a que se propunha...(em continuação, pág. 57, ex. XXI)

in A Causa de MassiftonRá
Novembro/2005

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

1DE DEZEMBRO DE 1640, 374 ANOS DEPOIS A INDIGNAÇÃO

Na minha muito modesta opinião considero que os feriados são uma demonstração de fé, quando celebram uma data religiosa, ou uma demonstração de muito respeito, e patriotismo, pela nobreza que se encerra nos factos da nossa história ocorridos nesse mesmo dia.


Naquele glorioso dia de 1 de Dezembro de 1640 portugueses imensamente patriotas, e contra toda a lógica circunstancial do tempo, restauraram a nossa independência, perdida em 1580, a favor da Espanha Filipina, no seguimento do desastre de Álcacer-Quibir.

Não me conheço a viver de uma outra forma este dia 1º de Dezembro, que não seja como feriado...até hoje.

Hoje, 1 de Dezembro de 2014, não é feriado. Portugal trabalha, produz, e com a produção deste dia irá resolver todos os seus problemas.

Se isto fosse verdade, valeria o sacrifício. Mas é mentira. Este acto mais não é que uma demonstração da enorme fraqueza de mentalidade política, de que estão investidos os nossos governantes, á semelhança de outros actos bizarros de que ultimamente têm sido actores.

O 1º de Dezembro representa o momento mais importante da nossa história, apenas tendo paralelo no momento de 1143 em que foi fundada a nossa nacionalidade, pois que, sem ele, não me estaria eu agora a expressar em português (com alguns erros), nem eu teria tido a oportunidade de viver o 25 de Abril.

Eliminar o feriado do 1º de Dezembro, é considerar que a Restauração da Independência não foi uma coisa assim tão importante, como tal um acto anti.patriótico.

Era muito bonito que os portugueses, em massa, tivessem a capacidade de se terem conseguido mobilizar em uníssono, e todo o país tivesse hoje faltado ao trabalho!

Os Restauradores da nossa Independência, pelo risco em que colocaram as suas vidas, há 374 anos, naquele primeiro dia de Dezembro de 1640, mereciam esse gesto.

Foi pena. Foi por pressentir estes fracos vínculos ao nosso passado histórico, que o governo teve a ousadia de cometer esta barbaridade...que a história registou!



sábado, 29 de novembro de 2014

NOTAS AMADORAS DE UMA HISTÓRIA QUE TAMBÉM É MINHA: NA LUSITÂNIA CAI O PODEROSO IMPÉRIO ROMANO E EMERGEM OS VISIGODOS

Lusitânia- ano de 415 d.C.
Os Romanos, que quatrocentos e quarenta e dois anos antes, em 27 a.C, haviam dividido a Hispânia Ulterior nas províncias da Bética e Lusitânia, viram-se forçados a pedir auxílio aos Visigodos, perante a invasão de outros povos bárbaros: os Alanos, Vândalos e Suevos.
No decurso desta invasão, anos depois, em 467 d.C, Conimbriga veria terminados os seus dias sob a acção de um ataque violentíssimo por parte dos Suevos. A população fugiu, em massa, para Aeminium, a poucos quilómetros de distância, na que hoje é a nobre cidade de Coimbra.
Este era o principio do fim da ocupação romana na Hispânia. Abriam-se as portas ao rei Visigodo Leovigildo, que em 570 d.C detinha total controle da Hispânia.
Em 589 d.C os Visigodos converteram-se ao cristianismo.
Ainda hoje, na esquecida aldeia de Idanha-A-Velha, podemos admirar uma das poucas catedrais visigóticas existentes em toda a Península Ibérica.

Uma nova era se iniciava no território que viria a ser Portugal.

sábado, 15 de novembro de 2014

NOTÍCIAS DE AKHENATON, DELEITE PARA SETH

...Todos os dias centenas de escorpiões Ulsh, Akunosh e Efru eram enviados para o mundo dos homens, tomando a forma de homens e mulheres, misturando-se com estes e criando constantes situações de conflito, invejas, ciúmes e muitas vezes de crime. Seth deleitava-se com a infelicidade que via gerar-se nos corações dos homens.
Ainda não tivera oportunidade de se vingar dos restantes deuses que o haviam expulsado de MassiftonRá, e com especial incidência em Amon-Rá, o deus supremo. Essa oportunidade chegou quando o seu fiel Tekhaib o informou de que os obreiros, chegados do mundo dos homens, traziam a notícia de que havia problemas sérios entre o faraó e Amon-Rá, e de que esses problemas tinham tido origem numa sacerdotisa de Amon-Rá, a qual fora subtraída pelo faraó ao templo, e feita rainha do Egipto; e que pelo meio existia a questão da sobrevivência do Sumo Sacerdote, que Amon-Rá queria a todo o custo defender da tirania do faraó.
Seth entrou em êxtase com tais notícias. Ponderou bastante sobre tais questões, querendo ser devidamente informado de todos os pormenores que rodeavam aquela fenomenal notícia. Aquele novo faraó era extraordinário!! Nem a ele, Seth, lhe passaria pela cabeça roubar uma sacerdotisa ao templo de Amon-Rá e fazer dela rainha do Egipto. Bem, o faraó era um ser extremamente poderoso e dominante na terra egípcia. Não admirava que o tivesse conseguido fazer, mas também tinha de ter uma grande dose de loucura para enfrentar assim o deus supremo. E havia ainda a questão do Sumo Sacerdote, que segundo informações trazidas pelos obreiros, escapara à fúria do faraó, desaparecendo do templo, o que fizera com que o faraó tivesse mandado chicotear o chefe dos soldados que haviam ido em busca do Sumo Sacerdote. Não havia dúvidas de que o faraó que se encontrava no poder era um pândego.

Já reflectira bastante sobre todas aquelas questões e decidira agir, pelo que chamou o seu dedicado Tekhaib...(em continuação, pág. 54, ex. XX)
in A Causa de MassiftonRá

Novembro/2005

sábado, 8 de novembro de 2014

PAIXÃO PELA LIBERDADE, UM VALOR OU MEMÓRIA?

Hoje, ao regressar a casa, deparei-me com a seguinte frase escrita numa parede: «a paixão pela liberdade é mais forte que todas as prisões».
Vim pelo caminho a pensar no seu significado. Uma frase tão forte, que antes do 25 de Abril seria uma frase furiosamente proibida, cujo teor na realidade deu direito a um lugar a muitos anti-fascistas, em muitas prisões, com especial incidência no Forte de Peniche e no Tarrafal, em Cabo Verde.
Nessa época, em que a liberdade era um valor absolutamente valioso, a nossa sociedade oprimida, explorada, a morrer na guerra, analfabeta e torturada, sabia, no entanto, ser muito mais humana se comparada com a de hoje. Nessa época os portugueses, sem deputados livres, sem partidos políticos, sem uma Assembléia da República democraticamente eleita, conheciam o seu semelhante e sabiam o significado da solidariedade.
Hoje em dia aquela frase está completamente banalizada. Hoje já ninguém está apaixonado pela liberdade. E esse é um dos grandes males da nossa sociedade. Convencemo-nos de que a liberdade que hoje respiramos é um bem absolutamente adquirido. Mas, com o nível de fraqueza moral de que uma grande maioria da nossa classe política padece, nada é seguro. É que o conceito da falta de liberdade alterou-se. Hoje em dia não é necessariamente obrigatório que, para que a falta de liberdade se manifeste, tenha de existir uma prisão.

Deram-nos a liberdade, mas nunca ninguém nos ensinou a viver nela e com ela!

sábado, 1 de novembro de 2014

NA VERGONHA DA APARÊNCIA DE UM BIBLOT DOMINGUEIRO

...Olhou até onde a vista alcançava. Divisava quase toda a Rua de S. Sebastião. As luzes dos candeeiros ainda estavam acesas. A rua estava deserta. Não passava um único carro. Lá ao fundo um cão atravessou a rua. E ele ali ia, sozinho, vestido com calças e dólman cinzentos, e porque era Domingo, envergava uma camisa branca. Foi das primeiras coisas com que embirrou na policia, foi ter de vestir camisa branca aos Domingos e feriados. Era uma parolice, sintoma de disponibilidade à despreocupação em melhorar a imagem. Ele sentia-se como um «biblot». Aos Domingos e feriados os policias vestiam-se de camisinha branca, para parecerem bem aos olhos do cidadão e fazer sobressair de algum modo um dia votado ao descanso, a que eles, no entanto, não tinham direito. As cidades ficavam muito mais belas com a alvura domingueira dos policias. Que falta de classe! Mas a classe faltava em muitas outras coisas.

         Monotonamente, com as mãos cruzadas atrás das costas, a pala do boné sobre os olhos, na tentativa de dar a entender uma imagem de modernidade, Serôdio iniciou a sua patrulha. O tempo tinha de passar. Se não havia ninguém com quem conversar, conversaria com as sua memórias...(em continuação, pág. 79, ex. XXVII)

in Filhos Pobres da Revolta

Março/2003

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

VIII JANELA SOBRE O MEU PAÍS: CONIMBRIGA, CIDADE ROMANA

Nas imediações da pequena localidade de Condeixa-A-Velha, a 17 quilómetros de Coimbra, encontram-se as ruínas da cidade romana da Lusitânia- Conimbriga.
Fundada no séc. I a.c., no reinado do Imperador Augusto, Conimbriga foi cidade importante, sede de bispado. Com o declínio do império romano, em 468 da nossa era Conimbriga foi atacada pelos Suevos, tendo perdido muito do seu fulgor e importância, pelo que a sede do bispado foi transferida desta cidade para a cidade vizinha de Aeminium (actual Coimbra). Rapidamente Conimbriga decaiu, tendo acabado por ser completamente abandonada.
Em resultado de intensas escavações que ali tiveram lugar durante todo o séc. XX, por parte do Instituto de Arqueologia de Coimbra e da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, Conimbriga voltou á vida, vendo de novo homens e mulheres passeando-se pelas suas ruas, enquanto vão imaginando os homens e mulheres de há dois mil anos calcorreando os mesmos caminhos, descendo os mesmos degraus, ensombrados pelas mesmas pedras.

Conimbriga é a génese da minha mui ilustre Coimbra.

sábado, 27 de setembro de 2014

PÂNICO NO GIRO...SARCASMO DE UM PATRULHEIRO

...Um subchefe meio trôpego, com aparência de carroceiro, olhos esbugalhados pelo muito álcool bebido em excesso, o cabelo cheio de caspa, o colarinho da camisa cinzenta da farda denunciando o uso abusivo sem ter sido lavada, transmitindo uma imagem que pouco ou nada se coadunava com as suas funções de chefia, numa instituição pública, acabara de fazer a formatura do primeiro turno de serviço daquele Domingo de Outubro de Mil Novecentos e Oitenta e Seis. A formatura era composta por oito homens, sendo eu um deles. Perfilávamo-nos em duas filas de quatro, num dos claustros do antigo convento setecentista das carmelitas, ocupado desde o principio do século pela Policia de Segurança Pública. Aquela formatura realizava-se, pois, nas instalações do Comando Distrital da PSP de Aveiro.
         O subchefe, numa conversação tosca, atrofiada e confusa, tentando exprimir-se no seu paupérrimo português, interrompido aqui e ali pelo horrível hábito de sugar as excreções das fossas nasais e cuspi-las logo a seguir, transmitia a relação de matrículas correspondentes a carros roubados. Os guardas, que tomavam nota daquelas matrículas, faziam-no de várias maneiras. Os menos aplicados escreviam num papel amarrotado que lhes dançava num dos bolsos das calças; outros, um pouco mais conscenciosos, anotavam as matrículas em papéis que para o efeito guardavam num dos bolsos do dólman; por último, os mais zelosos faziam as suas anotações em pequenas agendas de bolso.
         Transmitida a relação dos carros roubados, o subchefe com funções de comandante da guarda, fez ainda algumas determinações, tais como- «o giro não pode ser abandonado», como se entrado o guarda no seu giro de serviço e por qualquer razão se ausentasse, o tal giro ficaria desnorteado, andaria sem rumo, aflito pela ausência do seu protector. Com certeza que as pessoas que viviam na área do tal giro, se iriam sentir muito infelizes quando dessem conta de que o guarda, que as havia beneficiado com a sua magnânima presença, resolvera ausentar-se. Entrariam em pânico!
         Serôdio sorriu com esta imagem que imaginara. O guarda não podia abandonar o giro, porque com a sua ausência o giro entraria em colapso.
         Serôdio era um dos oito guardas que constituíam a formatura matinal daquele Domingo. Nós os oito, maquinalmente, subimos em grande algazarra as escadas de pedra que levavam ao primeiro andar, polidas pelo tempo, e fomos à sala de transmissões, onde operava o número nacional de emergência «115», buscar os obsoletos e pesados rádios «Motorola» para transmitirmos o que fosse necessário ser transmitido. Qualquer turno de serviço era assim que começava.
         Já na rua, Serôdio dirigiu-se para o giro que tão ansiosamente o aguardava. Voltou-se a rir, a rir sozinho, quando imaginou os moradores da sua área de serviço, que debruçados nos beirais das janelas o aguardavam ansiosamente. Ao verem-no finalmente chegar, todos respiravam de alívio.
         Que desilusão!! Ao chegar ao seu giro, Serôdio olhou vagamente para os prédios. Todas as janelas estavam fechadas e as persianas corridas. Se se ausentasse, o tal giro nem iria saber que ele ali estivera.

         Mas estava! E por ali iria permanecer nas próximas seis horas. Naquela manhã tinha a seu cuidado patrulhar as ruas Dr. Mário Sacramento e S. Sebastião. A meio do percurso ficava a sua casa e a casa dos seus pais, ainda na Viela da Fonte dos Amores. Talvez pudesse fazer um pequeno desvio... Deus o livrasse de tal ideia! Estava em Aveiro havia poucos dias, não queria por isso arranjar sarilhos. O subchefe que estava de ronda não tinha boa cara. Ele ainda era muito novo naquelas andanças, para facilitar!...(em continuação, pág. 79, ex. XXVI)

in Filhos Pobres da Revolta

Março/2003

sábado, 20 de setembro de 2014

NOTAS AMADORAS DE UMA HISTÓRIA QUE TAMBÉM É MINHA: HISPÂNIA ULTERIOR E OS LUSITANOS

Hispânia, nome que designava o território que veio a ser chamado de Península Ibérica, e que se mantém, derivou do termo «Spania», de origem Céltica.
Ano de 197 ac.: A Península que confinava com o início do Mar Mediterrâneo, foi administrativamente dividida pelo Império Romano em: Hispânia Citerior e Hispânia Ulterior.
A Hispânia Ulterior era ocupada pelo povo Lusitano, que em 155 ac. começou a oferecer resistência aos romanos, povo invasor.
Em 147 ac., os Lusitanos, continuando a guerra contra os romanos, eram chefiados por Viriato, figura que se tornou mítica na História de Portugal. Em 139 ac. o governador romano da Hispânia Ulterior, Servílio Cipião, deu ordens para que Viriato viesse a ser assassinado, sentença que se cumpriu apenas em 80 ac., governava então a Hispânia Ulterior Sertório.
Escreviam-se as primeiras linhas da História de Portugal.


sábado, 13 de setembro de 2014

ESPERANDO...

...Finalmente a maldita luz daquela janela se apagara. O homem saiu do interior do seu Simca 1100. Fechou a porta do carro, cuidadosamente, com a preocupação de fazer o menor barulho possível. Enquanto calçava umas luvas de plica preta, observava em seu redor, não fosse ser surpreendido por alguém que estivesse a pé na Rua Frei Tomé de Jesus. Estava todo vestido de preto, para melhor se poder confundir com a noite. Reparara que o candeeiro de iluminação pública mais próximo do número 61, distava daquele cerca de vinte metros. Isso era óptimo, porque assim a entrada daquela casa pouco beneficiava da luz emanada pelo candeeiro.
         Tinha a área já muito bem estudada, pois passara toda uma tarde sentado no interior do carro, vendo as movimentações da rua e especialmente observando as pessoas que habitavam o 61. Eram apenas três. Um casal de meia idade e uma jovem e atraente rapariga, que deveria ser filha. Naquele Sábado colocara o carro em frente ao 61 da Rua Frei Tomé de Jesus. Chegara ali já a noite descia. Levara um bom suprimento de alimentos, pois contava em ali jantar, tal como veio a acontecer. Chegara numa óptima hora, pois cerca de meia hora depois de ali se encontrar, viu o casal despedir-se da jovem, desejar-lhe uma boa noite e lançar-lhe um «até amanhã», que para ele soou maravilhosamente. A rapariga iria estar sozinha em casa. Seria um serviço simples, rápido e principalmente rentável.
         O arquitecto Duarte Amorim ia-lhe pagar uma boa maquia... imagine-se, para ele roubar daquela casa apenas um livro, um livro que se intitulava «Contacto». O homem sorria e abanava a cabeça. Aonde podiam chegar a ambição e as fantasias dos ricos.
         Já se apercebera de que a janela que se encontrava do lado direito da porta, janela essa que houvera pouco tempo estivera iluminada, deveria pertencer ao quarto da rapariga. Como o tal arquitecto vira a moça com o livro no regaço, presumia que ela o estivesse a ler, e como tivera a luz acesa até tarde, provavelmente o livro estaria ali, bem à mão de semear. Intuição de quem era ladrão profissional.

          A princípio ficara um pouco preocupado por o arquitecto Duarte Amorim ter conseguido chegar até ele. Sim, porque uma das habilidades daquela actividade era não ser conhecido fora do seu âmbito de acção. Mas quando soube que o Xavier Amorim era filho do tal arquitecto, sossegou mais o espírito. Embora o miúdo não fosse ladrão, tinha uma forte inclinação para simpatizar com eles. Talvez o rapazola se preparasse para no futuro ser o cérebro de um bando profissional. Burro não parecia ele ser. Seria mais um, de entre muitos, que escondiam as suas actividades ilícitas atrás de uma boa presença, uma privilegiada  posição social, um português refinado, um bom fato, uma lustrosa gravata, um bom perfume; e a raia miúda, como ele, è que levava por tabela. Mas os contitos de reis até que não faltavam... eventualmente dois ou três anitos na cadeia, era o preço que se pagava por um nível de vida bastante aceitável, sem preocupações...(em continuação, pág. 88, ex. XXVII)

in Visitados
Novembro/1999

domingo, 7 de setembro de 2014

FOI COMETIDA UMA INFÂMIA Á NOSSA IDENTIDADE HISTÓRICA

Por estes dias, um estúpido, um senil jovem de 26 anos, em Guimarães, partiu a espada da estátua do nosso primeiro rei, D. Afonso Henriques, e andou a passear-se com ela durante algum tempo, até ter sido detido pela policia e presente a tribunal. A estátua, que ostenta perto de nove séculos de história e independência, lá está, mutilada, como mutilada se encontra a imagem da nossa soberania.
Este acto é demonstrativo do que se pressente, no viver e pensar de uma grande percentagem da população portuguesa, que nenhuma ligação, nenhum orgulho, nenhum interesse demonstra pela história do seu povo. E quem não se rala, nem tem qualquer preocupação em perceber quem é, e porque razão o é, como pode pensar em conceber o seu futuro?
Talvez por todas estas razões, depois de termos sido bravos combatentes, ao cairmos agora numa passividade sufocante, seja possível que em Portugal se multipliquem os agravos á democracia, de toda a ordem.



sexta-feira, 22 de agosto de 2014

PROJECTO ARGUS, PROMESSA DE UM BOM LIVRO, ENQUANTO A GUERRA ACONTECE

...No 61 da Rua Frei Tomé de Jesus o silêncio imperava. Catarina encontrava-se no seu quarto, embrenhada na fabulosa e sedutora imaginação de um autor desconhecido, que fosse quem fosse, escrevera o livro « Contacto ». Ela lia deitada na cama, bem aconchegada pelo calor macio dos cobertores, caricia muito ansiada num Novembro muito frio.
         Era Sábado à noite. Só ela estava em casa. Os pais tinham ido passar a noite a uma quintarola de pessoas amigas, nos arredores de Coimbra, lá para os lados de S. Martinho do Bispo. Claro está que a tinham convidado, mas não, aquela pequena quinta não a seduzia em nada. No seu quarto, no seu pequeno grande mundo, sentia-se muito feliz. Ali residiam as suas tristezas, as suas alegrias, os seus gostos e desgostos, as suas certezas e incertezas, os seus pensamentos sérios, os seus devaneios, o amor de Álvaro expresso nas cartas escritas por ele, que ali no seu quarto guardava. Havia quatro dias que não recebia nem uma letrinha dele. Como isso a fazia sentir-se vazia! Decerto que tivera qualquer coisa para fazer, que o obrigava a afastar-se de uma folha de papel. Como estava a ser tola! Era claro que ele não estava em Angola para escrever cartas, mas... que malvadez o Estado fazia aos casais apaixonados, quando  arrancava os namorados dos braços um do outro e os afastavam por distâncias inimagináveis, durante eternidades, que os angustiavam, desgastavam e envelheciam. Catarina tomou uma expressão de preocupação. Seria possível que Álvaro viesse mais velho? Bem, mais velho viria!  Devia também vir mais tisnado, bronzeado pelo sol africano. Mas vinha mais maduro, mais homem. Deus permitisse que não viesse transformado num durão, como já ouvira muitas histórias de rapazes, que após cumprirem o serviço militar no Ultramar, vinham metamorfoseados em pessoas de coração frio, sem sentimentos de ternura, sempre prontos para uma boa briga. Mas não, com Álvaro tinha a certeza de que nada disso se iria passar, porque ele tinha a capacidade natural de conjugar harmoniosamente o verdadeiro homem que havia em si, com a delicadeza de espirito, a sensibilidade às coisas belas, o saber dar e receber amor.
         O livro mantinha-o aberto, virado com as páginas para baixo, poisado no ventre. A mente divagara um pouco, sinal de que o cansaço e o sono reclamavam aquele momento. Pegou no livro de capa preta e leu de novo as últimas linhas da penúltima página a que chegara. Era a página 80.- « ...anómala fonte rádio intermitente em ascensão recta 18h 34m, declinação mais 38 graus 41 minutos, descoberta por exploração sistemática do céu pelo Argus... ». Sem dúvida o projecto Argus detectara qualquer coisa no céu. O romance prometia. Olhando para o relógio reparou que já passava da uma hora da manhã. Fechou o livro, tendo o cuidado de colocar o marcador de papel amarelo na página 80, e poisou-o na mesinha de cabeceira. Seguidamente embrenhou-se no calor dos cobertores, deixou que toda a cama a envolvesse, apagou a luz e imperceptivelmente começou a escorregar para o mundo dos sonhos, o mundo onde muito se faz sem que disso se tenha consciência...(em continuação, pág. 86- ex. XXVI)

in Visitados
Novembro/1999
        


sábado, 16 de agosto de 2014

SOLDADO MILHÕES, EM ARMENTIÉRES...ESSE HERÓI ESQUECIDO

Durante uma semana, no mês passado, nos programas da manhã, a Rádio Renascença dedicou pequenas rubricas ao centenário da eclosão da I Grande Guerra, que aconteceu no dia 28 de Julho de 1914. E fê-lo, com a sensibilidade histórica de quem respeita a memória dos seus combatentes.
E confesso que enriqueceu os meus conhecimentos sobre o envolvimento de Portugal neste conflito, através do Corpo Expedicionário Português. E conseguiu-o, porque muito embora há muito que dedique a minha atenção á última batalha em que tropas portuguesas se viram envolvidas- a Batalha de La Lys, também conhecida por Armentiéres, nos pântanos da Flandres, em 9 de Abril de 1918, eu nunca tinha ouvido citar o nome de um herói nacional, completamente esquecido, do qual, esta semana a Rádio Renascença trouxe a memória á luz do dia- o soldado Aníbal Augusto Milhais, que ficou conhecido como o «Soldado Milhões».
O Soldado Milhões, nesse trágico dia 9 de Abril de 1918, em que vários milhares de soldados portugueses sucumbiram á avalanche alemã, completamente sozinho na sua trincheira, apenas acompanhado pela sua metralhadora Lewis, enfrentou as colunas alemãs, retardando o seu avanço, o que permitiu a retirada a muitos seus camaradas portugueses e também a soldados ingleses, para as posições defensivas. Deambulando pelas trincheiras, o Soldado Milhões salvou ainda um médico escocês de morrer afogado num pântano no local da batalha, médico este que deu conta do heroísmo do nosso soldado, natural de Valongo- Murça, em Trás-Os-Montes, ao exército aliado.
O Comandante Ferreira do Amaral diria, mais tarde, que o Soldado Aníbal Milhais, embora sendo «Milhais», valia por Milhões, daí a sua alcunha.
O Soldado Milhões é o único militar português, sem qualquer patente, ainda hoje, condecorado com a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito, por bravura demonstrada no campo de batalha.
Aníbal Augusto Milhais faleceu a 3 de Junho de 1970.

De um outro português, 96 anos depois, merece bem esta simples homenagem.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

PELO POVO CHORAM OS CARVALHOS

...Era já noite quando o mouro abandonou o solar. Mais uma vez, entre o fivelas e o mouro ficara selada uma sentença de morte. Entre os dois ficou ainda a convicção de que o pobre povo é destituído de ideias. Erro deles! O povo tem sempre a bolsa vazia, o que não obriga a ter vazia a mente. O povo sofre, o povo chora, mas o povo pensa. E quando o povo, esporadicamente, ultrapassa a barreira do pensamento, quando transforma ideias em actos, surgem as revoluções. Dizia o padre José Soares que " numa boa ou má política está a sorte de um povo". E na vontade do povo está a sorte dos políticos.
Em contraste com as mentes perversas daqueles dois homens, que dominavam toda a herdade Vila de Ló, a natureza corria meiga. Naquele principio de Novembro de 1922, o Outono deleitava as pessoas com a maciez do ar. Mesmo na dura labuta da lavoura os homens deixavam-se envolver pelas carícias outonais, pelos sorrisos que a natureza lhes enviava. Viver a mãe natureza, respirar a mãe natureza, tornava de uma certa forma  menos penosa a tarefa de à mãe natureza resgatar o pão.

A mesma mãe natureza que por abandono do homem fizera nascer junto aos seis carvalhos, existentes bem pertinho do Casal das Rãs, um espesso silvado, pintado aqui e ali pelo despontar medroso de uma esquiva rosa ou tímido cravo, memórias antigas do labor de um dedicado jardineiro. E se se estiver bem atento, talvez se adivinhe que os seis carvalhos choram quando o vento outonal desliza pelos ramos nus. Choram os carvalhos a memória do jardineiro. Choram os carvalhos a memória de Vila de Ló...( em continuação, pág. 115, ex. XLII)

in Quando Um Anjo Peca
Março/1998

sexta-feira, 25 de julho de 2014

VII JANELA SOBRE O MEU PAÍS- O FAROL DA BARRA

Saindo de Aveiro, em direcção ao Atlântico, e percorridos dez quilómetros, encontramos as praias da Costa Nova e da Barra. E é nesta última que vamos encontrar uma pérola de construção civil, dos finais do Séc. XIX: o Farol da Barra.
O Farol da Barra foi construído entre 1885 e 1893, tendo sido electrificado em 1936.
Com os seus 62 metros de altura, é o farol mais alto de Portugal, o 2º maior da Península Ibérica, sendo o 21º mais alto do mundo.
Tem um alcance luminoso de 43 kms.

Sabe muito bem uma bica, tomada numa bela noite de verão, numa esplanada de café, sob a presença vigilante deste portentoso farol, ali, a meia dúzia de metros.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

PROMESSA DE MORTE

...O mouro ia deveras agitado. Ruminava ameaças. As esporas que possuía na base das botas de montar feriam os flancos do cavalo que montava. Ao chegar à herdade, o pobre animal sangrava das feridas provocadas pelos bicos aguçados das esporas. Aquele sangue era o reflexo da raiva que consumia o mouro. A curta distância que separava o casario trabalhador do solar, fora percorrida pelo mouro num galope veloz, alimentado por instintos sanguinários.
Chegado ao solar o mouro desmontou e dirigiu-se em passos largos e rápidos à porta principal, na qual bateu brutalmente com os punhos cerrados.
- Patrão, ó patrão, venha cá fora - clamava o mouro furiosamente.
Chegava o fim da tarde de mais um dia de Outono. Corriam os primeiros dias de Novembro. Barreto Raposo encontrava-se no escritório, fazendo contas, utilizando uma aritmética muito própria, constituída por símbolos que só ele sabia decifrar. Necessidades de quem nunca aprendera o significado de letras e números. Possuído por uma grande cobiça e uma incomensurável ambição, Barreto Raposo foi obrigado a criar o seu próprio sistema aritmético, para assim poder gerir os seus bens, muitas vezes os frutos da sua esperteza maldosa, do seu mau carácter, sem ter de recorrer a ninguém, para não correr o risco de dar a conhecer a sua deplorável conduta. Ouviu os batimentos de desespero, reconheceu a voz do mouro e atravessou o comprido corredor.
- O que é que se passa mouro? - abriu a porta e deparou com o seu capataz de feições alteradas, olhar mais frio do que nunca, espuma branca e nojenta aos cantos da boca.
- Eu mato-os a todos - dizia o mouro.
- A quem é que tu matas? - perguntou o fivelas, curioso.
- Aquela reles da Lucinda, o padre e o zarolho.
- Não estou a perceber - dizia o Barreto Raposo - pareces um bezerro tresmalhado. Põe-me as ideias no sítio e explica-te. Pelo que vejo há aí história.
- E das grandes patrão.
- Conta-me o que se passou.
- Vinha eu de passar uma vista de olhos pela herdade. Encaminhava-me já para aqui. Ao passar pela casa do Daniel ouvi a mulher dele a chorar e a rir ao mesmo tempo. Achei aquilo muito sem "trambelhos". Desmontei e quando me aproximava da casa saiu-me ela como doida, a dizer que havia de contar ao marido, que o menino dela estava vivo há doze anos...
- Disseste há doze anos?
- Foi o que eu ouvi ela dizer.
- Eh raio! Há doze anos tomei eu conta da herdade. Também me fica uma pulga atrás da orelha. E que mais?
- Ela quando me viu chamou-me belzebu. Eu ia-me a ela quando de dentro da casa apareceu o padre.
- O padre?
- Foi verdade. Logo ali me disse uma lengalenga. Não percebi nada mas ficou-me a ideia de que o padreco esteve a mangar de mim. Subiu-me cá o nervoso, que com duas das minhas o pus em sentido. Mas para ajudar à festa apareceu também o zarolho que se pôs a defender o padre e a ameaçar-me.
- E porque é que logo na altura não lhe ensinaste algumas das tuas habilidades?
- Deixei isso para um outro dia, para quando me possa desforrar bem à minha maneira - disse o mouro, escondendo do Barreto Raposo as apreensões que sentira quando teve vontade de atacar o António Avilar.
- Tu tens razão mouro. Aí há história. O padre já estava em Alfeizerão quando eu para cá vim. Segundo me parece ele era muito amigo do fidalgote. Falar-se aí nalguma coisa que aconteceu há doze anos, estando o padre misturado com o povinho, cheira-me a esturro. Haverá por aqui qualquer coisa que eu desconheça?
- Ó patrão, se houvesse eu já sabia.
- Talvez sim, talvez não. As cabeças vazias dos «pobretas» por vezes conseguem pensar. Se tens andado atento, põe-te mais atento ainda. Mas nada de fazeres qualquer coisa contra a Lucinda ou o padre. Não me estavas a ajudar em nada. Já reparei que a Lucinda é muito estimada pelas gentes de cá e com respeito ao padre, desse nem se fala.
- E o zarolho patrão? Esse também se fica a rir?
- Não, a esse podes tu chegar-lhe com força. Se quiseres manda-o desta para melhor. Não me agradam aqueles que provocam o meu capataz.

- Ah rico patrãozinho, que a falar assim nunca a língua se lhe tolha. Pois àquele hei-de eu tratar da saúde, pode o patrão ficar descansado...(em continuação, pág. 115- ex. XLI)

in Quando Um Anjo Peca
Março/1998

terça-feira, 8 de julho de 2014

FILIPE VI DE ESPANHA- UM TESTE Á NOSSA IDENTIDADE HISTÓRICA

Nunca me passou pela cabeça que, um dia, fosse possível conviver com o regresso de um Filipe ao trono de Espanha. Mas ele aí está! Filipe VI, o segundo Filipe depois do Filipe IV de Espanha, Filipe III de Portugal.


Nos nossos actuais 871 anos de história como país independente, muitos têm sido os momentos de forte tensão e guerra com o país vizinho, do qual nos tornámos independentes em 1143- a Espanha. Ficam sempre resquícios. O ditado popular «de Espanha nem bom vento nem bom casamento» é sintomático disso. O dia 14 de Agosto de 1385, nos campos de Aljubarrota e o dia 1 de Dezembro de 1640, em Lisboa, são duas datas que bem nos diferenciam de Espanha.

Quando ainda existe a questão de Olivença por resolver, uma cidade que nos foi roubada por Espanha, em 1801, na sequência da patética «guerra das laranjas», no pronúncio das Invasões Francesas, eis que a história no mês passado me bateu no coração, ao ouvir que um novo Filipe iria ocupar, em breve, o trono de Espanha.

É curioso que isto acontece, quando em Portugal, uns idiotas a quem, infelizmente lhes foi dado poderes de governação, pretendem desvalorizar a memória desse dia de raça bem portuguesa, o 1º de Dezembro de 1640.

E ontem Filipe VI de Espanha pisou terra portuguesa. Não sei se, porventura, algum resquicío histórico, dos muitos, dos imensos, que existem por essas pedras mudas, terá vibrado, terá tocado as sirenes de alerta. Apenas sei que eu não me senti muito confortável com a visita. O rei até tem cara de boa pessoa. A história que o antecede é que lhe não é nada simpática.

Seria interessante saber quantos portugueses pensaram nesta questão. Não é que ela tenha alguma relevância prática, mas que é um teste á relação que temos com a nossa identidade histórica, disso não tenho qualquer dúvida.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

VI JANELA SOBRE O MEU PAÍS- UM VISLUMBRE DA PRAIA DA COSTA NOVA

Na região de Aveiro existem algumas pequenas localidades que tomaram a designação de «gafanha», sendo-lhes depois acrescentado um segundo nome.

A presente fotografia foi obtida numa dessas gafanhas- a Gafanha da Encarnação. Distante de Aveiro cerca de dez quilómetros, apresenta no entanto todas as especificidades que definem a região aveirense: a ria, o moliceiro, e ao fundo, do outro lado da ria, que aqui já pressente o mar, a belíssima praia da Costa Nova do Prado, eu diria mesmo- a elegante praia da Costa Nova. E para que não restem dúvidas de que esta é terra lusitana, ao vento, no topo do mastro do moliceiro, flutua a nossa bandeira. 

sábado, 31 de maio de 2014

PORTUGAL, BRASIL E ALMEIDA GARRETT Á MESA DO ABSOLUTISMO

...Fiquei por uns instantes a segui-la com os olhos.
- A minha irmã pode tornar-se numa mulher muito atraente – disse o filho do conde, que me observava.
- Realmente – retorqui – mas acho a senhora D. Maria Clara tomada por uma grande tristeza – disse eu, dirigindo-me ao conde.
- Sabe senhor doutor, as mulheres vivem em permanentes romances. Sonham com o amor da sua vida, que se ainda não chegou, um dia há-de chegar. Já a minha falecida mulher era assim, mesmo depois de eu ter chegado. E por vezes, certas leituras não fazem bem nenhum.
- Leituras? – perguntei eu com curiosidade.
- Chegaram ás mãos da minha filha uns versozitos desse pedreiro-livre, o Almeida Garrett. Leituras subversivas, que transtornam a cabeça de uma moça.
- Conheci o Almeida Garrett na Universidade – disse eu, inocentemente.
- Mas é claro que somente o conheceu… nunca privou com ele.
         Estávamos a entrar numa matéria perigosa.
- Não, nunca privei com ele. O Almeida Garrett pertencia ao núcleo de poetas. Eu nunca tive veia para a poesia.
- Mas lê? – perguntou-me o filho do conde.
- Se leio poesia? De quando em vez.
- Já leu versos do Almeida Garrett?
- E quem me faz a pergunta? O senhor Pedro Corga ou o senhor oficial?
- Pedro, deixe-se lá dessas questões. O doutor é meu médico e meu convidado – disse o Conde de Cértima, repreendendo o filho.
- Mas, meu pai, com todo o respeito, estamos apenas a conversar.
- Não esteja incomodado, senhor conde. É para mim um prazer conversar com o filho de vossa excelência – disse eu, mais confiante, por saber que era protegido do conde.
Eu sentia que aquela conversa não seria apenas uma conversa de circunstância. Respondi então a Pedro Corga:
         - É claro que li Almeida Garrett. È claro que sou politicamente esclarecido, se era isso que o senhor queria saber.
- E qual a leitura que faz do estado actual do reino?
- Senhor Pedro Corga, há tanto para dizer acerca disso. O que de melhor aconteceu foi sua Majestade ter regressado a Portugal.
- Para o filho, esse infame, ter imediatamente a seguir dado a independência ao Brasil – ripostou o filho do conde.
- D. Pedro, um infame? Não o considero assim. Pode não ter zelado pelos interesses de Portugal, mas muito pior fez agora, este ano, o seu irmão D. Miguel, ao querer prender o próprio rei e pai.
- Pelas suas palavras, deduzo que prefere a perda da colónia do Brasil à manutenção da ordem no reino.
- Senhor Pedro Corga, se analisarmos bem ambas as situações, verificamos que as duas foram criadas pelo Paço Real. Se perdemos a colónia do Brasil, foi por acção do príncipe herdeiro ao trono de Portugal. Se, porventura, o reino anda conturbado, tal acontece porque o próprio rei jurou a Constituição há dois anos.
- Jurou-a porque a tal foi pressionado por todos aqueles que defendem os ideais liberais, um veneno trazido por quem nos tentou oprimir – disse, por sua vez, o Conde de Cértima, com azedume.
- Eu, como súbdito de Sua Majestade, apraz-me acatar as suas decisões. Como tal não as discuto. Vivo a minha vida consoante os regulamentos da coroa – disse eu, sentindo-me atacado e pressionado a revelar as minhas convicções politicas, que eu queria esconder a todo o custo, naquele momento.
- Então o doutor é um homem sem pensamento próprio – retorquiu Pedro Corga, em tom de provocação.

- Não, senhor Pedro Corga. Sou um homem que até pensa muito… essencialmente penso nas doenças, que são tantas, que por todo o lado afligem este reino – disse eu, defendendo-me...(em continuação, pág. 36- ex. XVI)
in Alma de Liberal
Junho/2009

quinta-feira, 22 de maio de 2014

PRAXE

Já não é novidade nenhuma de que sou de Coimbra. Orgulhosamente o digo, muito embora tenha deixado de lá viver desde o dia 14 de Agosto de 1974, pelos meus 18 anos. O que quer dizer que a minha infância e a minha adolescência ficaram para todo o sempre impregnadas da essência coimbrã. E é para toda a vida! Por essa razão o espirito conimbricense mantém-se vivo e de muito boa saúde em mim. E um dos aspectos de todo essa preciosidade é, inevitavelmente, as praxes académicas.
Nunca li nada que me dê a definição de praxe. Por isso, vou tentar dar a minha. Praxe será todo o conjunto de acções, levadas a cabo por estudantes universitários, pelas quais recriam todo o espirito académico, em que se inclui darem as boas vindas aos recém chegados- caloiros, inserindo-os assim nesse mesmo espirito.
Em Coimbra, a praxe, não é exclusiva da universidade. Faz parte da vida da cidade. Não esqueçamos de que a Queima das Fitas é o expoente máximo da praxe da Universidade de Coimbra, logo seguida pela serenata monumental, e, obviamente, o fado de Coimbra. A capa e batina foi idealizada em função da praxe.
Antigamente, as trupes eram uma espécie de «órgão fiscalizador», que vigiava a forma como os caloiros faziam a gestão do seu tempo fora das aulas, no sentido de os lembrar de que estavam em Coimbra, fundamentalmente, para tirarem um curso superior. Por essa razão todos os estudantes que fossem encontrados na rua, depois das seis da tarde, sofriam uma enorme rapadela. Tempos em que, na nossa sociedade, existia uma muita maior responsabilização.
Hoje tudo é diferente!
No nosso país, no espaço de quatro meses, morreram nove estudantes universitários, alegadamente quando se encontravam em actividades de praxe. Seis foram levados por uma onda, em Dezembro, na Praia do Meco, em Setúbal, quando se encontravam na praia, de madrugada, pelo que transpareceu que ali se encontravam reunidos numa qualquer acção de praxe; outros três, em Abril último, faleceram, em Braga, quando uma parede ruiu, abatendo-se sobre os três, sendo que em cima dessa parede, que supostamente já se encontrava com indícios de abater, outros estudantes se encontravam empoleirados aos pulos.
É muito grave, e logo múltiplas vozes sonantes se fizeram ouvir, no sentido de a praxe ser eliminada.
A praxe deixar de existir em Coimbra é algo impensável, porque ela é sangue da cidade. Logo a seguir ao 25 de Abril a praxe foi extinta na minha cidade, e Coimbra emudeceu. Inevitavelmente poucos anos depois a praxe foi recuperada, porque não podia ser de outra forma. Coimbra não seria bem a nossa querida Aeminium, sem a queima e a serenata.
Se no país querem fazer imitações, pelo menos que o façam com responsabilidade. O conceito da praxe é uma coisa bonita. Ela não tem culpa que a adulterem.
Como se diz na Alta:
A Queima é em Coimbra o resto são fitas!
Lamento profundamente a morte destes nove jovens estudantes. Respeito pelas suas memórias há pouco, já que a organização de um festival rock não se coibiu de fazer, este verão, mais uma edição na praia do Meco, depois da tragédia que ali aconteceu.
Tenho imenso respeito pela terrível dor que, decerto, os pais destes jovens sentirão.


sexta-feira, 14 de março de 2014

NAQUELA CASA, UMA SOMBRA QUE POR VEZES SORRI

...Entretanto foi servido um soberbo arroz de pato. Até àquele momento, Maria Clara, filha do conde, ainda não pronunciara uma única palavra. Parecia que não estava sentada àquela mesa. Aproveitando o interregno que se fez no nosso acalorado diálogo, com a chegada do arroz de pato, dirigi a palavra àquela mulher tão silenciosa, tão permanentemente introspectiva. Como tinha vontade de a ouvir falar, mas sem saber o que lhe dizer que lhe provocasse as palavras, lembrei-me de lhe fazer uma pergunta cujo teor estivesse directamente relacionado com a minha presença ali. Por isso perguntei:
- E como vai a saúde da senhora D. Maria Clara?
- A saúde da minha irmã vai muito bem. Ela é uma donzela de ferro – respondeu-me o irmão, com um sorriso forçado.
         Por um breve momento eu fixei o filho do Conde de Cértima, com vontade de lhe perguntar se ele se chamava Maria Clara. Mas é claro que não o fiz, nem nunca o faria… pelo menos naquele local.
- Como diz meu irmão, a minha saúde é boa, senhor doutor – disse finalmente Maria Clara.
         A voz dela traduzia força de carácter, boa saúde, mas nenhuma alegria. Eu não tinha qualquer intimidade com ela para lhe poder dizer que a achava uma mulher muito triste. Mas teria de dizer alguma coisa. O meu sexto sentido impelia-me a fazê-lo.
- Reconheço que tem umas óptimas cores, que traduzem, só por si, boa saúde, mas esse espírito…
- O doutor também é padre? – Perguntou Pedro Corga, com rispidez.
- Não, apenas estou a tentar fazer uma avaliação…
- Senhor doutor, peço-lhe que desculpe o meu filho. Sabe, na vida militar os rigores da disciplina endurecem os homens.
         Pelo canto do olho, enquanto o Conde de Cértima me dirigia estas palavras, apercebi-me de que Pedro Corga fazia um sinal á irmã, pelo que de imediato a ouvi dizer:
- Senhor meu pai, peço-lhe licença para me retirar.
- Não é muito cortês fazê-lo, na presença de uma visita – disse o conde.
- O senhor doutor me perdoará, mas tenho os meus votos para cumprir.
- Por quem é, minha senhora – disse eu.
- Pois então pode retirar-se, minha filha.
         Todos nos levantámos quando Maria Clara abandonou a mesa...
(em continuação, pág. 34- ex. XV )
in Alma de Liberal
Junho/2009