sábado, 1 de novembro de 2014

NA VERGONHA DA APARÊNCIA DE UM BIBLOT DOMINGUEIRO

...Olhou até onde a vista alcançava. Divisava quase toda a Rua de S. Sebastião. As luzes dos candeeiros ainda estavam acesas. A rua estava deserta. Não passava um único carro. Lá ao fundo um cão atravessou a rua. E ele ali ia, sozinho, vestido com calças e dólman cinzentos, e porque era Domingo, envergava uma camisa branca. Foi das primeiras coisas com que embirrou na policia, foi ter de vestir camisa branca aos Domingos e feriados. Era uma parolice, sintoma de disponibilidade à despreocupação em melhorar a imagem. Ele sentia-se como um «biblot». Aos Domingos e feriados os policias vestiam-se de camisinha branca, para parecerem bem aos olhos do cidadão e fazer sobressair de algum modo um dia votado ao descanso, a que eles, no entanto, não tinham direito. As cidades ficavam muito mais belas com a alvura domingueira dos policias. Que falta de classe! Mas a classe faltava em muitas outras coisas.

         Monotonamente, com as mãos cruzadas atrás das costas, a pala do boné sobre os olhos, na tentativa de dar a entender uma imagem de modernidade, Serôdio iniciou a sua patrulha. O tempo tinha de passar. Se não havia ninguém com quem conversar, conversaria com as sua memórias...(em continuação, pág. 79, ex. XXVII)

in Filhos Pobres da Revolta

Março/2003

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