...Os dias
foram-se escoando. Depois de muitas manifestações de estupidez a que assistira,
que provocaram o aumento da desilusão no seu intimo, chegou o dia 16 de Junho
de 1983, dia em que prestou o Compromisso de Honra. Aquela cerimónia foi em tudo
idêntica ao Juramento de Bandeira na tropa. As companhias perfilaram-se, os
guardas provisórios comprometeram-se a defender a segurança interna do país e
depois desfilaram perante os seus familiares e uma tribuna recheada de gente
distinta, tais como coronéis, majores e altos comissários. Quando as
companhias, marchando, faziam o «olhar à direita», prestando assim continência
às altas individualidades, Serôdio num breve momento pôde apreciar as
«carrancas» nobres e distintas dos senhores, que carregados de galões e
medalhas brilhando ao peito, estavam maravilhados com aquele belo espectáculo,
composto por quinhentos e setenta rapazes marchando, que assim enchiam a
população de Torres Novas de muita alegria. Portugal rejubilava de satisfação,
porque tinha mais quinhentos e setenta queridos policias ao seu serviço. Era
pois perfeitamente compreensível a felicidade que se via estampada, nos rostos
fechados pelo embrutecimento, dos oficiais que naquela tribuna se encontravam.
Naquele momento, estavam perfeitamente conscientes de que prestavam um grande
serviço ao país, e assim justificavam em pleno os bons vencimentos que
auferiam... enquanto os rapazes, vestidos com a sua farda de gala, para muitos
o único fato que até ali haviam conhecido, à sua frente passavam a «olhar à
direita»... «olhar à direita»...
Na alocução que o comandante da escola
proferira, um Comissário Principal, dissera que estar-se na policia não era
ter-se um emprego. O serviço da PSP teria sempre que estar sustentado por um
alto espirito de missão. Logo naquele momento, aquela ideologia não soou muito
bem a Serôdio. E estava certo nessa dúvida, como mais tarde veio a constatar.
Mas por enquanto ele era apenas um guardita, de olhos fechados, que ia ser
lançado para o meio do circo de feras. Essa era a sua grande preocupação.
Com muito ou pouco gosto era
efectivamente um agente da PSP, e teria que se assumir como tal...(em continuação, pág. 87, ex. XXXIV)
in Filhos Pobres da Revolta
Março/2003
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