sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

O ATAQUE

- O que è que se passa aqui?- perguntou D. Silvina.
- Infelizmente não me enganei D. Silvina. Estes tipos ainda não disseram absolutamente nada. Estão com medo que eu lhes reconheça a voz- disse Serôdio com voz exaltada, sintoma da excitação.
- Qual de vocês è o meu sobrinho Narciso?- perguntou D. Silvina.
Como resposta, o assaltante que mais próximo se encontrava de Serôdio, num gesto rapidíssimo, pegou numa das lanças que se encontravam no chão e com ela em riste correu na direcção de D. Silvina. Serôdio apenas teve tempo de se lançar em voo, fazendo-lhe uma autêntica placagem de rugby. Ambos caíram por terra.
Armando, tendo pressentido as intenções daquele indivíduo, quando o viu dirigir-se para a sua patroa, desinteressou-se dos outros e foi em auxílio de Serôdio, tendo então pegado, também ele, numa lança. Serôdio, suplantado em força física pelo oponente, tentava desesperadamente que ele o não atingisse com a ponta metálica e afiada da lança. Com uma força que ele foi buscar sem saber onde, conseguiu desarmar o intruso. Este, furioso, pontapeou o peito e o rosto de Serôdio. Vendo no entanto aproximar-se o criado negro com a lança em riste, preferiu fugir. Quando o fez a sala estava vazia.
Serôdio tinha as costelas doridas e desenhava-se-lhe um hematoma no rosto.
- Armando, vai tentar ver por onde saíram- ordenou D. Silvina.
- Sim, senhora- respondeu o criado negro, que logo abalou, levando a lança bem agarrada numa das mãos.
- Tens de ir ao hospital, Serôdio.
- Não vale a pena D. Silvina. Isto não è nada.
- È, è. Esse hematoma na cara está a ficar muito feio.
- Foram só dois pontapés.
- E eu vi com que violência foram dados. Aquele indivíduo è mesmo mau.
- E è esperto. Nunca abriu a boca- retorquiu Serôdio, que com muita dificuldade se levantava, ajudado por D. Silvina.
- Se não fosses tu, ele tinha-me atingido com a lança e não sei o que teria sido de mim- disse a senhora, apoiando Serôdio.
- Ele realmente atacou-a cheio de raiva.
- Ficámos sem saber se isto teve relação com o que o teu colega ouviu na casa de banho do café.
- D. Silvina, eu não tenho grandes dúvidas- disse Serôdio- se eles nunca falaram, por alguma razão foi. È estranho que não tenham comunicado verbalmente entre si. Eles não o fizeram porque receavam que eu, a senhora ou mesmo o Armando lhes reconhecêssemos as vozes.
- Sim, tu tens razão, mas no fundo não passam de conjecturas da nossa parte. Não existem certezas.
- Uma certeza há D. Silvina. Eles sabiam onde o cofre estava escondido. Mesmo às escuras o encontraram. E a senhora não acha grande coincidência, o facto de ter sido assaltada na mesma noite em que eu a vim avisar de que isso iria acontecer?
- Tens razão Serôdio. Amanhã vou falar com o meu irmão. Não sei bem o que lhe irei dizer, mas não posso, a partir de agora, viver com esta desconfiança.
- Eles fugiram pela porta lá de trás- disse Armando, que entretanto regressara.
- Mas essa porta estava fechada, não estava Armando?
- Estava sim , senhora. Mas a porta foi aberta com a chave que falta no molhe. Eram três chaves e só lá estão duas.
- E quando è que essa chave faltou?- perguntou Serôdio.
- Não sei jovem moço- respondeu o criado negro.
- Aquela è uma porta que tem pouca utilização- retorquiu D. Silvina.
- Alguém que frequenta esta casa apercebeu-se disso, apoderou-se de uma das chaves e...
- Será que o meu sobrinho Narciso pode ser assim falso como Judas?
- Pelo menos com os colegas ele nunca soube ser leal- disse Serôdio.
- Bem, vamos então ao hospital.
- Mas D. Silvina, isto...
- Tu não tens querer, meu rapazinho. Precisas de tratamento. Armando, vai tirar o carro da garagem.
- Sim senhora, vou já- disse o criado negro abalando rapidamente.
- Eu posso ligar para o meu pai...
- Não ligas coisíssima nenhuma. Vais agora apoquentar a pobre criatura, a uma hora destas!! Já basta entrares em casa com esse hematoma no rosto. Vamos indo, que o Armando num instante prepara o carro...(em continuação- pág. 33- ex. X)

in FILHOS POBRES DA REVOLTA

Março/2003

1 comentário:

Teresa Fidalgo disse...

Caro Poeta do Penedo,
Deixei-lhe um desfio lá no meu blog. Espero que participe...
(não sei se é muito apologista destas coisas, mas não podia deixar de o fazer).