domingo, 11 de junho de 2017

MISERÁVEIS CONDIÇÕES OFERECIDAS COM SORRISOS CÍNICOS


...De Torres Novas ficaram-lhe as saudades do intenso sabor a Ribatejo que existia no ar, e dos petiscos que comeu no típico restaurante «Solar do Melro».
         A vila ribatejana era já e só uma recordação. Descobrindo a rudeza do serviço da patrulha, Serôdio percorria agora as ruas de Lisboa. E numa sumptuosa manhã de sol lisboeta, o então jovem guarda de segunda classe da Policia de Segurança Pública sofreu o seu primeiro grande choque profissional. Prestava serviço em Lisboa havia dois meses. A adaptação à nova vida fazia-se muito lentamente. Andava cansado, pois dormir em camaratas de apoio a esquadras operacionais, era bem diferente do que dormir nas camaratas de Torres Novas. Em Lisboa era um corrupio constante de homens. Ora iam para gratificados, ora vinham de gratificados. Uns iam fazer o turno de serviço, outros chegavam tendo-o acabado. Até se habituar aos inúmeros despertadores que tocavam, aos muitos roncos dos que dormiam, ao barulho, muitas das vezes propositado, feito por alguns que sem qualquer tipo de formação moral ou cívica, desrespeitavam o descanso de outros, aos cheiros exalados por corpos menos habituados à higiene, era difícil a Serôdio conciliar o sono. Mas era nas miseráveis condições que a PSP e os sorrisos hipócritas dos seus oficiais tão delicadamente ofereciam aos guardas, que Serôdio teria de aprender a viver. Casas degradadas, onde funcionavam sombrias e asquerosas camaratas, faziam parte do seu quotidiano, enquanto profissional de policia. Com o espirito nutrido pelo degradante ambiente da sua camarata, quando entrasse de serviço havia de ser linda a missão!!
         Independentemente da desmotivação criada pelas condições terceiro-mundistas em que descansava, naquela manhã Serôdio estava bem disposto, pois o sol matinal irradiava felicidade que o tornava prenhe de alegria.
         Efectuava o serviço em patrulha dobrada, tendo por companhia um colega bem mais velho. Eram onze horas da manhã e o seu colega já visitara três tasquinhas. Nas duas primeiras bebera um cálice de «Favaios» em cada uma e na terceira despejara um copo de «ginja com elas». Obviamente que Serôdio detestava a companhia. O homem praticamente que ainda não abrira a boca. A principio Serôdio tinha a intenção de pedir ao seu colega mais velho explicações sobre formas de comportamento, perante variadas situações, mas depressa desistiu da ideia. Aquele policia veterano apenas conhecia o caminho para as tascas e bares de prostitutas...(em continuação, pág. 88, ex. XXXV)
in Filhos Pobres da Revolta
Março/2003

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