domingo, 6 de dezembro de 2009

CONTACTO- O LIVRO DA ESPERANÇA NO REGRESSO

...O escritório era pequeno. Ali existia uma secretária feita em madeira, uma estante e três cadeiras. Na parede encontravam-se três fotografias penduradas e emolduradas por molduras de madeira, onde se podia ver o pai de Álvaro, o enfermeiro Victor, em três momentos de confraternização com colegas seus, momentos esses que para ele deveriam ter um significado especial. Em cima da secretária estava um pequeno candeeiro curvo, pintado de preto e uma outra moldura, esta poisada no tampo da secretária, onde Álvaro exibia todo o seu franco e amistoso sorriso, na companhia dos pais, por ocasião do vigésimo aniversário do casamento deles.
Na estante existiam três prateleiras que estavam repletas de livros. Catarina abriu as duas portas envidraçadas de par em par, e com o olhar começou a percorrer as quarenta ou cinquenta lombadas que ali existiam. Deteve o olhar numa lombada preta onde se podia ler a palavra « Contacto ». Catarina retirou o livro, enquanto Álvaro colocado atrás dela, com o rosto colado ao rosto dela, a envolvia com os seus braços, que se cruzavam por cima dos seios dela. Catarina perguntou:
- Que livro è este?
- Desde que me lembro de ser gente, que vejo esse livro aí. O meu pai deve-o ter comprado há muitos anos.
- È um livro técnico, è um romance ou o que è?
- Penso que è um romance. Um dia tive curiosidade em o folhear. È uma história sobre o espaço.
- O espaço? Então è ficção científica!
- Acho que sim. Mas existe aí uma coisa nada normal.
- O que è?
- Esse livro não tem o nome do autor.
- Não? Será que foi o teu pai que o escreveu?
- O meu pai? Não, nunca foi muito dado à escrita. A sua especialidade são as injecções e os pensos.
- Então o livro não è teu, pois não?
- Não, mas se quiseres podes levá-lo. Nunca vi o meu pai demonstrar grande interesse por esse livro. Aliás, penso que nos últimos vinte anos eu fui a única pessoa que lhe mexeu. E depois, o livro ao estar contigo não pode ficar em melhores mãos.
- Obrigado Álvaro. Eu adoro ficção cientifica.
E Catarina abriu o livro. Depois da página de rosto, na página seguinte surgiu uma pequena dedicatória, que dizia: « para Alexandra que atinge a maioridade no milénio. Possamos nós deixar à tua geração um mundo melhor do que a nós foi deixado ».
- Misteriosa esta dedicatória- disse Catarina.
- Porquê?
- Este milénio será o ano 2001, presumo eu. Se esta Alexandra atinge a maioridade no ano 2001, quer dizer que nesse ano irá fazer dezoito anos, pelo que se presume que terá nascido em 1983. Como pode isto ser possível, se ainda faltam dez anos para chegarmos a 1983? E se tu dizes que o livro já aqui está pelo menos há vinte anos, è verdadeiramente incrível. Como pode alguém indicar tão peremptoriamente o ano de nascimento de outra pessoa décadas antes de esse ano chegar?
- O que leva a crer que aí dentro estará magnífica ficção cientifica. Lê-o e manda-me dizer o que de mais espectacular encontrares. Vou ficar ansioso pelo teu contacto acerca do « Contacto ».
Enquanto ela escolhia outros livros, ele embrenhava-se mais e mais no corpo dela. Os lábios dele passeavam-se pelo pescoço dela, as mãos dele estavam frenéticas e exploradoras. Mansamente, imperceptivelmente, desabotoaram os botões da camisa dela. Ele sentiu a pele dela aveludada, quente, sensual. Catarina fingia manter-se interessada nos livros, mas a sua voluptuosidade traiu-a. Repentinamente se virou para Álvaro e loucamente se beijaram.
Por algum tempo todo o mundo teria de esperar. Até África, até Angola, ali não representavam nada. O amor sempre os transportara para um mundo diferente. Mas naquele momento, o amor era infinitamente mais intenso. Tinha o poder de alcançar para lá do corpo, porque no fundo, bem lá no abismo dos seus sentimentos, eles sentiam não ter a certeza se mais alguma vez se voltariam a amar. Iriam ser separados por um oceano de dúvidas, um mar inteiro de preces...(em continuação- ex. XVII- pág. 50)

in VISITADOS

Novembro/1999

2 comentários:

Mari Amorim disse...

Olá poeta,
vim visita-lo e ler teus textos,o qual gosto muito.
Um grande abraço brasileiro.adoro compartilhar minha amizade com os blogs dos amigos portugueses
bjs
Mari

Poeta do Penedo disse...

viva Mari
graças à net, estou a fazer amigos no Brasil, coisa que anos atrás considerava ser impossível.

Obrigado pela visita.
Com amizade.