domingo, 20 de julho de 2008

A MINHA VELHA COIMBRA


esporadicamente vou à minha cidade. A Baixa e a Alta praticamente que estão imutáveis. A Rua da Sofia, a Praça 8 de Maio, a Visconde da Luz, a zona antiga da cidade (Rua Direita, Rua da Moeda), a igreja solene de S. Bartolomeu, que se situa na Praça do Comércio, são a Coimbra do meu tempo. Lá está a imponente Igreja de Santa Cruz, onde repousam os restos mortais do fundador da nacionalidade.
Na Alta, o Arco de Almedina, as escadas do Quebra-Costas, A Sé Velha, a Rua da Ilha, a Rua da Matemática, as Escadinhas da Carqueija. Ainda existe o edifício que um dia albergou o velhinho cinema Sousa Bastos, de cadeiras de suma a pau, onde fui a muitas matinées. Era então o cinema mais antigo de Coimbra, e como tal, onde passavam filmes de menor qualidade e com as piores condições de conforto; mas qualquer conimbricense que se presasse, tinha de, vez em quando, frequentar o Sousa Bastos. E eu guardo carinhosas memórias daquele cinema.
Nos dezoito anos em que vivi na minha terra, fi-lo sempre afastado do coração da cidade. Vivi em Coselhas, na Rua Figueira da Foz, à Casa do Sal, no Calhabé, no Pinhal de Marrocos, na Conchada e no Bairro da Cumeada, aos Olivais. Mas era na Baixa e na Alta que se desenrolava a vida estudantil.
O café Bocage, principalmente, era o grande pólo de concentração da malta de pasta flexível de cabedal na mão, que tomava uma forma curva, na qual, com mestria, encaixávamos os livros, que sem qualquer protecção se mantinham compactados uns contra os outros, sem que se espalhassem pelo chão. A minha capa de cabedal, era castanha, e em baixo relevo apresentava a figura do Eça de Queiroz. E eu, que até os cadernos diários timbrados pelo Liceu D. João III guardo com orgulho, não sei que sumiço dei àquela saudosa capa. Se a tivesse preservado, teria agora 34 anos e seria um objecto valiosíssimo que enriqueceria o meu património familiar.
No período em que morei na Conchada, quando me dirigia para a Baixa passava pelo estreito e castiço Beco de Montarroio, com as suas casas pequenas e infindáveis estendais de roupa a secar. Tudo o resto se transformou em Coimbra, ares que me são estranhos.
Pode isto parecer um churrilho de palavras patéticas, que apenas falam de sítios de uma cidade...coisa tão banal! Poderá alguém dizer: e ocupa este gajo de 52 anos de idade espaço à blogosfera portuguesa, com esta porra de nomes de ruas...
Poderão alguns pensar assim. Mas é importante para mim que Coimbra se não esqueça deste seu filho, que a não habita há 34 anos, mas a mantém viva no peito. E que melhor forma de o fazer do que lhe trazer à memória as suas veias antigas. Coimbra lê estas palavras e pensará: nao há dúvida, só um filho meu conheceria estes meus pequenos cantinhos.
Para quem nasceu, viveu e continua a viver em Coimbra, pouca ou nenhuma importância dá ao facto de, em tempos ter andado por Montarroio, porque por lá continua a passar diariamente. Mas para mim, que por lá não passo há três décadas, é importante que se saiba que eu sei da existência de Montarroio.
Coisas que a saudade provoca, que o presente despreza, mas que o passado agradece.

2 comentários:

ana disse...

Poeta do Penedo: Saiu de Coimbra quando eu cá cheguei... se as contas à sua idade e aos dezoito anos que viveu em Coimbra não me enganam...
Movimentei-me sensivelmente pelos "seus" sítios... e continuo a fazê-lo trinta e tal anos passados!
A magia de Coimbra tomou conta de mim... já não me lembro que não nasci aqui!

Poeta do Penedo disse...

olá ana
pois é, já não se lembra que não nasceu aí, e eu não me esqueço que foi aí que nasci.
Felizes dos que passam a vida inteira no seu chão. Felizes dos que, como a ana, fazem seu o chão que não os viu nascer.
Fico feliz por ver que a minha cidade a cativou.
A vida deu-me a oportunidade de, pelo menos, ter em Coimbra vivido o 25 de Abril. Foram apenas 18 anos, mas que preencheram a minha vida para sempre.
Quando passar em Montarroio, junto ao pátio da inquisição, diga a essa pedras da calçada que eu ainda existo, o rapazito da Conchada.
Obrigado.